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Rosa Negra

Iniciado por Vifibi, 08/01/2013 às 20:51

Era uma cachoeira à beira de uma encruzilhada. A luz da lua refletia nos respingos guerreiros d'água que caíam  pelas pedras, formando na base um pequeno lago cristalino que mostrava uma lua ondulante. A estrada de barro e pedra ficava invisível enquanto eu estava lá, e tudo ao meu redor parecia embaçado, como se eu estivesse sonhando. Olhando para trás, eu podia ver outras cachoeiras, com outras pedras e outras guerras d'água.

Sentado numa rocha plana de um material que me parecia mármore em frente à cachoeira estava uma mulher. Seu corpo nu pálido refletia a luz da lua, atraindo minha atenção. Ela tinha curtos cabelos, da cor de um fogo jovem, e um rosto que parecia nunca ter visto um Verão vigoroso ou uma vida de problemas. Ela cobria com as mãos seus seios, doces súcubos fartos, praticamente implorando para me levar ao pecado.

Seu posterior era amplo, bonito, e em lugar algum de sua pele pálida e frágil havia uma marca que denunciasse sua idade, sua juventude. Suas bochechas eram pronunciadas, de forma a lhe dar um ar jovial, mas sem detrair de sua beleza. Seu queixo era fino e alongado, e, como o resto do corpo, parecia capaz de quebrar com o vento. Seus olhos, de um castanho-escuro quase negro, refletiam para mim minha própria face cansada, receosa e cheia de marcas. Seu nariz era alongado e forte, em contraste com o resto de seu corpo, mas lhe caía bem. Seus lábios carnudos e rosas contraíram-se num sorriso fraco, e ela se virou de costas para mim, como que me convidando.

Andei até ela vagarosamente, como se temesse algo. Minhas pernas tremiam, assim como meus braços, e eu mal conseguia me manter em pé. Minha barriga estava aos nós, sem qualquer esperança de eu conseguir falar, e eu suava frio. Medo dominava cada passo que eu dava, e cada vez que eu chegava mais perto dela, o medo aumentava.

Ao se retirar uma rosa antes do tempo, essa rosa não morre se você a botar em água. Mas ela nunca atinge sua beleza total. Ela nunca atinge seu potencial. Ela nunca entrará em flor como entraria sem sua interferência. Mas se você deixa a rosa tempo demais, ela definha e envelhece e perde seu brilho, e perde a necessidade de você. Uma rosa deve ser retirada da terra, de seu berço, no momento correto, e nenhum momento antes ou depois.

Me pergunto que tipo de rosa era aquela sentada em minha frente, de costas para mim mas me olhando pelo canto do olho com atenção. Ela queria que eu a abraçasse, que a beijasse, que a tomasse por minha, e eu podia senti-lo, mas não sabia quem ela era. Seu nome era claro para mim, gravado em minha memória por todas as nossas experiências, mas sua identidade agora me era um mistério.

Talvez fosse a rosa do destino, levando-me para as brumas impenetráveis de Valhalla. Talvez fosse a rosa do receio, amargamente aceitando-me e preparando-se para se arrepender imediatamente após. Seus olhos, seus lindos olhos... Talvez fosse a rosa da paixão? A rosa que, após tantos anos felicitando e enaltecendo homens, finalmente acharia um companheiro para si?

Contra todos os meus instintos, pus as mãos em seus ombros. Esperava um ataque, um pulo, algum tipo de reação, mas nenhuma reação foi conseguida. Ela pareceu notar as mãos agora posicionadas nela, mas não lhes deu atenção. Comecei a acariciar-lhe, indo contra todas as sortes do mundo, massageando seus ombros e pescoço.

Ela pôs as mãos sobre as minhas, e deu-me um beijo na mão direita. Levantou-se com cuidado — parecia incapaz até mesmo de ficar em pé, tal frágil era — e me fitou nos olhos, desejando-me mas ao mesmo tempo temendo minha presença. Meu coração partiu ao ver sua expressão. Me aproximei dela, e ela se afastou. Andei mais, e ela correu. Dei um pulo para frente, por pura insistência, e ela caiu para trás. Corri ao seu socorro, e vi-a deitada, nua, na grama. Ela chorava, temendo minha presença e amaldiçoando minha chegada. Abracei-a para segurá-la em meus braços, e ela se debateu, tentando escapar de mim. Segurei firme, e por fim ela parou. Olhei-a novamente, e suas lágrimas haviam sumido. Ela agora me observava receosa como antes, mas também com avidez, desejo. Talvez... Talvez ela fosse a rosa da paixão, afinal.

Aproximei meu rosto do dela. Seus lábios se abriram, aqueles doces lábios rosados, que pareciam me convidar com cada tremulação, e ela segurou a respiração. Eu desci e a beijei nos lábios, e ficamos engatados durante alguns segundos. Era isso que ela desejava. Aprender. Minhas mãos correram por seu corpo esguio e repousaram em seus quadris. Interrompi o beijo, e a vi olhando para si mesma não com o mesmo receio de antes, mas agora com uma vontade inexplicável. Talvez ela não fosse a rosa da paixão. Mas certamente não me fazia diferença. Se ela desejava aprender, eu lhe ensinaria.

E eu lhe ensinei. Ela mordeu os lábios em antecipação, e eu a tornei minha, com cuidado e carinho, mas ainda assim lhe fiz chorar. Sua beleza agora estava vazia, vã. Havia fugido pelo selo que eu havia rompido dentro de si, e agora ela era a rosa que havia sido pega cedo demais do jardim.

Ela era a rosa da inocência. A Eva do Jardim do Éden, eu era sua maçã, o conhecimento corrupto do mundo do além-paraíso. Eu era seu pecado, aquele que lhe traria o mal apesar de tudo, e que no final a deixaria uma casca de um ser outrora lindo. A rosa da inocência foi cortada e destruída por minhas mãos grosseiras e desajeitadas. Sua graça não era mais.

Era uma rosa negra agora.