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Sanguinem Patron

Iniciado por B.loder, 15/11/2013 às 23:53

Sanguinem Patron

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Martin usava um sobretudo negro de couro, suas luvas e botas também eram feitas deste material. Tinha um chapéu preto com o tecido tampando completamente o pescoço, no rosto usava uma máscara com dois olhos enormes de vidro e um bico pontudo. Nenhuma parte de seu corpo era visível e por baixo da roupa havia algo que o fazia parecer mais forte do que realmente era. Virou-se para o colega que se vestia de forma igual, mas parecia maior e mais forte.

– Diabos, não vamos poder usar isso durante o verão, mesmo com esse frio dos infernos eu já estou cozinhando aqui dentro!

– É isso ou esconder Rose, você quem decide.

– Não, se tivermos algum problema nós fazemos isso... Por quê tem que ser sempre sério? – Ele ficou calado.

Uma garota puxou o sobretudo, tentando chamar a atenção do homem. Ela tinha cabelos loiros e cacheados que caíam sobre os ombros, usava um vestido branco simples e estava descalça, sorriu quando ele a fitou. As bochechas eram pálidas e os olhos de um azul-claro impressionante,  parecia ter pouco mais de dez anos. Ele se agachou e encarou-a.

– Olá garotinha, o que deseja?

– Você é o caçador de vampiros de quem todo mundo fala?

– Não, querida, para ser um caçador eu é quem deveria procurá-los, sou no máximo uma presa que sabe se defender. Agora, onde estão seus pais?

– Eles estão na feira, não precisa se preocupar – falou alegremente.

– Ah, tudo bem então. – falou enquanto estudava o sorriso dela. Olhou por trás do ombro para o colega.

– Irwin! – ele passou a fitá-lo rapidamente. – Qual o tamanho médio do canino de uma criança? – observou-a. – De uns cinco anos.

– Nove milímetros?

– Hm... – fitou-a. – Então, quando seus amigos vão chegar?

Eles estavam em uma rua larga e pouco movimentada. Tinham um pequeno balcão com rodas que usavam para levar os produtos, o homem maior abriu um compartimento escondido de onde tirou duas espadas cujas lâminas pareciam ter um metro cada, caminhou até o colega e lhe entregou uma delas. A garotinha estava tensa, suando frio.

– Bem, diga para eles que estamos esperando – falou com uma voz suave que a fez estremecer.

A lua cheia brilhava forte no fim da rua, formando as sombras dos homens que se aproximavam. Os postes criavam várias sombras no chão enquanto eles caminhavam lentamente, eram sete. Reconheceu imediatamente um deles, era o açougueiro com quem tinha comprado o almoço, era robusto e careca, tinha o rosto arredondado e usava um avental branco. Segurou a espada com firmeza e colocou-se em posição, brandindo-a com as duas mãos à frente do corpo.

Irwin passou por ele e fez um sinal com a mão para que não avançasse, parou entre os homens que se aproximavam e o colega. Soltou a espada, pegou de dentro do sobretudo um frasco e jogou seu conteúdo nas mãos, como se as lavasse. Agarrou uma estaca de madeira com a mão esquerda e empunhou novamente a arma. Esperou paciente que eles se aproximassem.

– Você coloca outro para lutar por você? Covarde!

– Ele é meu guarda-costas, é a função dele – falou sorridente.

Abriu por pouco o sobretudo, em seu cinto estavam várias facas pequenas ele tirou uma delas e posicionou sua mão, mirou com calma e precisão, mantendo o braço firme. Lançou a faca e esta acertou o peito de um dos homens, ele riu, tentando parecer arrogante, mas imediatamente levou a mão ao local do ferimento, sentindo uma dor horrível. Sua mão também estava ardendo, observou a ferida levar mais tempo que o normal para cicatrizar com espanto.

– Como?!

– Irwin, quer mostrar para eles o efeito da prata sobre vampiros? Aposto que vão ficar tão fascinados quanto eu fiquei.

– É para já, chefe.

– Matem esse desgraçado! – o açougueiro gritou.

Vários vampiros correram rapidamente na direção deles, exibindo suas garras e presas como animais prestes a atacar uma presa indefesa. Um deles, loiro de cabelo curto, saltou sobre Irwin como um tigre e foi recebido com uma estaca no coração, caindo no chão imediatamente. O corpo do vampiro entrou em combustão e rapidamente foi completamente queimado, deixando somente sua marca em cinzas na rua de ladrilhos da cidade.

Os outros ficaram tensos e tentaram atacar ao mesmo tempo, uma mulher de cabelos longos negros tentou cortar sua nuca, mas foi parada ao sentir seu braço ser furado por uma faca de prata que parecia queimar, fazendo-a sentir uma dor aguda e cruel, foi a última coisa que sentiu antes de ser decapitada por Irwin e ter seu corpo inteiro queimado.

Um vampiro mais alto que o comum conseguiu golpeá-lo nas costas, fazendo-o cair no chão. Dois vampiros tentavam cortá-lo com suas garras enormes enquanto ele os afastava com chutes e socos. Martin corria até ele quando um dos inimigos pareceu surgir do nada ao seu lado, desferindo-lhe um corte de raspão no peito. Afastou-se e jogou nele um pó que o fez levar as mãos ao rosto, querendo rasgá-lo em dor. Antes que pudesse notar ela foi substituída por ter seu pescoço cortado.

Irwin segurava os braços de dois vampiros que tentavam feri-lo. Agarrou com força o da esquerda e o jogou por cima do outro, chutou o alto, este cambaleou para trás e foi recebido com uma estaca de madeira que empalou seu peito por Martin, desaparecendo em chamas. O homem se colocou de pé e vasculhou o que estava em seu cinto, encontrou somente uma estaca.

Foi até os dois que também estavam em pé, agarrou a estaca com a mão direita e observou ambos ficarem eriçados como gatos tentando assustar o inimigo. Socou o da esquerda no rosto e aproveitou para cravar a arma no peito do outro, jogando-o para longe enquanto se desfazia em cinzas. Agora sem nenhuma arma desferiu vários golpes no último que estava no lugar. Acertou-o na barriga e depois no rosto, um chute no joelho o fez desequilibrar e cair no chão. Martin caminhou até ele sem pressa e colocou a estaca em seu peito, observou o rosto dele com calma e então pressionou-a, perfurando o coração.

– Como você fez isso?

– O quê?

– Matou três deles de uma vez enquanto estavam em cima de você!

– Ah, não foi tão difícil. Minhas luvas estavam molhadas com água benta, foi até fácil fazer eles se afastarem.

– Eles não conseguiram te pegar, conseguiram?

– Não! – disse levantando a parte que protegia o pescoço. – Mas foi por pouco.

– Acho melhor tomarmos mais cuidado de agora em diante, parar de ficar desafiando eles.

– Nós precisamos de uma armadilha.

– O açougueiro, você o matou?

– Não.

– Acho que sei onde vamos encontrar alguém para interrogar.

– Ele não seria tão burro...

– Não seria? – sorriu. – Só tem um jeito de descobrir.

Martin tinha cabelo castanho, claro, curto e liso, olhos verdes e nariz pequeno. Acordou em sua cama de casal e percebeu que estava só, esfregou os olhos e levantou-se. Usava um calção para dormir, viu que Irwin estava sentado numa cadeira próxima enquanto lia a bíblia, ele vestia roupas formais, uma calça preta, sapato bem polido, blusa simples e um casaco marrom xadrez por cima, um chapéu marrom sobre o cabelo negro e um cachecol vermelho.

– Bom dia – ele falou tirando os olhos do livro e logo voltando-se para ele.

– Bom dia, que horas são?

– Duas da tarde – olhou no relógio de pulso para conferir.

– Droga, eu vou me arrumar e vamos fazer uma visita ao açougueiro.

– Se arrume, tome um café, aí podemos ir.

– Tudo bem – entrou no banheiro.

O quarto era espaçoso, tinha dois sofás e uma cama de casal enorme, uma lareira e um tapete feito com pele de urso. Saiu do banheiro usando roupas parecidas com as do colega, então desceu as escadas, a sala de estar também era grande, tinha duas escadas para o primeiro andar, onde ficava um conjunto de sofás posicionados para a lareira. Haviam várias mulheres lá.

– Martin, querido, você demorou muito para acordar – Rose falou levantando-se, usava um vestido longo branco com luvas.

– Não se preocupe, já estou de saída, só vou comer alguma coisa.

– Tudo bem, tente não voltar tão tarde hoje, já estou ficando enciumada.

– Ah, você sabe que eu não te trocaria – sorriu e parou seu caminho para a cozinha, foi até ela e lhe deu um beijo apaixonado, as mulheres observaram atentas, sorriu para elas e continuou para a cozinha. Sentou-se preguiçosamente à mesa.

– Martha, será que você poderia trazer pão e leite para mim? Estou faminto.

– Sim, só um segundo – saiu apressada para a despensa.

Ela colocou sobre a mesa o café da manhã atrasado e ele comeu com calma. Irwin sentou ao seu lado e voltou a ler o livro, o homem parecia ter um metro e noventa, musculoso. Tinha barba preta como o cabelo, lábios finos, olhos castanhos e queixo quadrado. Terminou a refeição e se levantaram. Saíram da mansão e foram para a carroça, onde deram instruções de ir ao açougue onde tinham comprado carne no dia anterior.

– Não dá para carregar muita coisa, o que vamos levar? – Irwin perguntou deixando a bíblia no banco.

– Essa pasta – exibiu a pasta que estava guardada embaixo do banco. – Aqui tem tudo que podemos chegar a precisar. É meu kit reserva.

– Tudo bem, quando chegarmos lá não faça nenhuma besteira.

– Pare com isso, desde que eu te falei dessa bagunça toda você tem sido superprotetor.

– Eu sou seu guarda-costas, lembra? – riu. – E se alguma coisa acontecer com você... Bem é meu dever te manter vivo, não importa o que aconteça – suspirou. – Isso e o fato de Rose ter me dito que se algo te acontecer ela me mata.

– Agora todo mundo quer me proteger – riu. – Eu sei me cuidar.

– O que teria acontecido ontem se eu não estivesse?

– Eu provavelmente estaria me escondendo do sol agora – admitiu. – Ou talvez estivesse morto, nunca disse que não preciso de ajuda, se fosse tão arrogante assim não teria te chamado, só não precisa me tratar como uma criança.

– Tudo bem.

Chegaram à porta do açougue e pediram que o senhor aguardasse com a carroça um pouco mais longe, para não chamar muita atenção. Entrou no lugar carregando a mala, a luz vinha de lampiões bem colocados, a única janela era o vidro na porta da frente. O piso e a parede eram de madeira, havia carne cheia de sal no balcão. Aproximaram-se, o açougueiro observou Irwin tenso, o homem tinha uma postura imponente e a altura era assustadora.

– Como posso ajudá-lo, senhor Wilde?

– Eu gostaria de ver as suas melhores carnes, não essas que você deixa aqui à mostra, eu sei que você tem coisa muito melhor lá atrás.

– Eu não costumo deixar meus clientes...

– Oras, que mal poderia ter? Eu só quero poder escolher uma carne de qualidade, talvez até indicar para vários dos meus amigos, sabe como essa indicação faria bem para seus negócios, não sabe?

– Eu...

– Podemos?

– Tudo bem – disse relutante.

Ele abriu o balcão para que entrassem e então destrancou a porta que ficava atrás dele, entraram e observaram o lugar com cautela. Haviam cabides segurando grandes pedaços de carne em todo lugar, o cheiro de sangue era perturbador e ficaram tensos, havia pouca luz. Ele fechou a porta atrás deles.

– Ah, um segundo, eu esqueci uma coisa lá fora – disse saindo, deixando o colega sozinho com o vampiro. Pegou uma cadeira que vira antes e levou para dentro.

– Essa cadeira é minha...

– Ei! – Irwin falou, chamando a atenção do homem.

O açougueiro levou um soco no rosto que o deixou desnorteado, então levou mais dois e cambaleou para trás tropeçando. O guarda-costas se aproximou e jogou pó no rosto dele, fazendo arder tanto que não conseguia se conter. Deu mais um golpe que o deixou desacordado, aproveitaram para amarrá-lo na cadeira e quando acordou parecia desesperado.

– Senhor Wilde, o que diabos está acontecendo aqui?

– Você também pode me chamar de caçador de vampiros, se quiser.

– Então é você? – falou furiosamente. – Maldito, eu vou arrancar a sua carne! Você matou meus amigos lá! Miserável!

– Se me lembro bem, eram vocês que estavam dispostos a me matar.

– Desgraçado!

– Agora, qual era seu nome mesmo?

– Nun... – foi surpreendido com um soco no rosto.

– De novo, qual seu nome?

– Edgar.

– Ótimo, Edgar, eu tenho algumas perguntas para fazer, e dependendo das suas respostas, pode sair vivo daqui. E não aja com arrogância, nós dois sabemos que você se caga de medo do meu colega aqui – Irwin sorriu com uma estaca nas mãos. – Então vamos lá, primeira pergunta, quem era a garotinha de ontem?

– Ninguém – murmurou.

– Irwin, será que você...

– Sofia! – Admitiu. – O nome dela é Sofia!

– E quem é ela?

– Minha filha!

– Vampiros tem filhos? Você teve ela antes ou depois de se tornar um vampiro?

– Depois...

– Fascinante, isso com certeza é novidade – pareceu alegre. – Acho que talvez você consiga mesmo sair vivo daqui, Edgar. Próxima pergunta, onde fica o templo do Orus?

– Não sei!

– Ah, então você e seis vampiros simplesmente decidiram que seria divertido me procurar?

– Eles nos enviaram uma carta, mas não disseram onde estavam!

– E onde está essa carta?

– Eu queimei, todos nós queimamos!

– Isso está estranho.

– O que foi? – Irwin perguntou.

– Esse cara está cooperando fácil demais, não acha?

– É verdade – respondeu pensativo. – O que está planejando, colega?

– Nada, eu não quero mais saber do Orus, não me importa mais nenhuma dessas merdas, eu só quero continuar minha vida em paz! – parecia desesperado.

– Hm, isso faz sentido – virou para o colega. – Ele é só um covarde que quer viver, por isso fugiu ontem... Bem, vamos lá, eu tenho mais uma pergunta. Quem é o seu patrono?

– Myrho?

– Hm, nós já ouvimos esse?

– Já, semana passada aquela velha disse esse.

– Droga, então só o Orus sabe o nome verdadeiro do maldito?

– Parece que sim...

– Tudo bem então.

– Vão me deixar viver?

– Você é burro? Depois de tudo isso, acha que eu deixaria simplesmente ir embora e contar para todo mundo quem eu sou?

– Mas...

– Não se preocupe, não parece doer muito quando usamos a estaca, nós poderíamos te jogar no sol e esperar morrer queimado, é bem pior.

– Maldito – debateu-se na cadeira.

Irwin cravou a estaca no peito do homem gordo que se debateu pouco antes do fogo consumi-lo, deixando a cadeira e a corda chamuscadas. Estavam juntando as coisas quando ouviram um barulho abafado, era como se alguém batesse contra a parede com algo macio. Seguiram o som e foram guiados a uma porta sem maçaneta, esta tinha somente um buraco para uma chave, sendo quase indistinguível da parede. Saiu do caminho e deixou o colega arrombar, ali estava uma mulher amordaçada com os braços presos nas costas, o cômodo tinha uma lamparina e uma cama. Ela tinha cabelos loiros cumpridos, olhos verdes e usava um vestido branco.

– Quem é você? – disse enquanto tirava a mordaça e desamarrava ela.

– Me chamo Helena... – falou enquanto chorava. – Ele... Ele me... – abraçou a barriga, tentando não lembrar. – Estu... – tentou continuar sem sucesso, então calou-se.

– Não se preocupe, aquele porco está morto, você vai ficar bem agora. Há quanto tempo está aqui?

– Três anos – Martin sentiu um ódio imensurável e olhou novamente para a cadeira vazia.

– Droga, devíamos ter jogado ele no sol!

– Calma, ela está bem agora.

– Tudo bem, você tem que vir comigo.

– Por quê?

– Porque viu meu rosto, mas não se preocupe, quando tudo isso acabar juro que será liberta – suspirou. – E até lá você vai viver em uma mansão com comida e banhos quentes, isso parece bom para você?

– Minha família...

– Eu realmente sinto muito, mas nós vamos dar um jeito nisso e você poderá voltar para casa em breve, tudo bem, Helena?

– Eu... Tudo bem – cedeu. – Eu só quero ir para longe daqui!

– Não precisa se preocupar, ele não pode mais te ferir – abraçou-a de uma forma protetora. – Você vai ficar bem.

– Obrigada – disse enquanto tentava se acalmar.

Saiu correndo do lugar e pediu para o senhor levar a carroça até a frente do estabelecimento, assim poderiam levá-la para casa sem chamar atenção. Ele o fez e logo estavam a caminho de sua casa. Ao chegar conferiu que não havia mais ninguém além de sua família e convidou-a para entrar. Quando sua esposa observou a mulher ficou surpresa, então fitou-o curiosa.

– Agora vai manter reféns aqui em casa?

– Ela não é um refém, nem um vampiro – suspirou. – Irwin, ela ficará em seu quarto, tudo bem? – ele assentiu. – Leve-a para lá, preciso conversar com Rose.

– Tudo bem, boa sorte – observou-a. – Vai precisar.

– Querida... – os viu se afastarem, quando entraram no quarto ele continuou. – Ela estava sendo mantida refém de um vampiro.

– E daí?

– Ela esteve presa por três anos, também foi estuprada várias vezes por ele.

– Coitada – subitamente pareceu compassiva. – Mas por quê aqui em casa?

– Ela viu meu rosto...

– Eu entendo... Ela não tem família?

– Tem, mas por enquanto não poderá voltar, já conversei com ela e parece ter aceito bem tudo isso. E... Ao que parece ela teve um filho com o vampiro.

– Vampiros podem ter filhos?

– É um dos motivos pelos quais eu quero conversar com ela direito.

– Martin... Eu...

– Eu sei que está preocupada.

– Acho melhor eu viajar, assim você pode terminar o que começou sem se preocupar conosco, eu sei o quanto isso é importante, eu também sei que estou atrapalhando, seria melhor ir para algum lugar.

– Talvez você esteja certa... Eu vou pensar em alguma coisa, mas por agora não precisa se preocupar, não há qualquer ligação entre o caçador de vampiros e eu, estamos seguros por enquanto.

– E se alguém tiver visto?

– Eu... Tudo bem, eu sei que está com medo, eu vou arrumar algum lugar para vocês ficarem, podemos lidar com isso depois? Estou cheio de coisas na cabeça agora.

– Tudo bem.

– Será que pode pedir para Martha preparar um banho quente para a moça? Isso vai ajudar a recuperação mental dela, deve estar traumatizada. Um banho vai ajudar a deixar tudo para trás.

– Farei isso – disse saindo.

– Você vai mandar ela para algum lugar seguro? – Irwin perguntou sentando-se no sofá ao lado do colega na biblioteca da casa. Martin folheava um livro de biologia atento. Continuou calado. – Ei, preste atenção, estamos falando da segurança de Rose aqui!

– Ah, sim, desculpe, passei a noite toda estudando a hipótese, vampiros não deveriam poder ter filhos, isso coloca toda a situação sob uma nova perspectiva! Eles podem ter filhos entre si ou a mulher precisa ser humana? A criança já nasce vampira? Provavelmente não, ela seria um bebê para sempre, então ele deve ter transformado ela... Desculpe, Rose, o que acha? Está segura aqui?

– Não – respondeu parecendo mal-humorado.

– Hm... Realmente, se alguém... Não, mesmo que tenham nos visto trazendo a moça para dentro, isso não atrairia os vampiros, a maioria das pessoas aqui não tem nada com eles.

– A garota.

– Que garota?

– A que veio falar com você ontem, se ela é filha dele ela pode querer vingança, pode ter visto, ela é um perigo em potencial.

– Isso é verdade, e pela atuação eu diria que ela gosta de ser um vampiro. Ah, é uma pena, tão nova e já corrompida pelo demônio. Bem, então nem sei o porquê de estarmos discutindo isso, temos que tirá-la daqui agora!

– Para onde?

– Não faço ideia. Será que você pode arranjar isso para mim? – recusou. – Por favor, eu não conheço ninguém, sua mãe pode ajudar muito, por favor...

– Droga Martin, eu não vou colocar ela num bordel!

– Por quê não? É o lugar mais seguro em que ela pode estar. Ninguém nunca suspeita dos bordéis.

– Não.

– Por...

– Não, eu vou achar algum outro lugar para colocar elas, mas não o Bordel!

– Então temos um acordo?

– Droga – suspirou. – Tudo bem, eu vou achar um lugar seguro para elas, de preferência um onde não sejam expostas a todo tipo de coisa.

– Obrigado, agora eu voltarei a estudar sobre como ele teve uma filha.

Irwin suspirou novamente e se levantou preguiçosamente, derrubou o chapéu do colega e saiu da sala caminhando lentamente, com as mãos no casaco. Estava frio. Ao fechar a porta notou Helena se aproximando, agora usava um vestido de Rose que lhe servia perfeitamente. Estendeu a mão, ela lhe entregou a sua e este a beijou.

– Já está melhor?

– Sim, eu... Foram três anos, eu já não me importava tanto – tentou esconder a tristeza com um sorriso. – Eu quero falar com o homem que me salvou, será que eu poderia?

– E ele leva todo o crédito de novo – riu. – As garotas sempre preferem o lorde charmoso ao guarda-costas – ajeitou o chapéu. – Ele está ocupado, mas acho que sua companhia fará muito bem – acenou e saiu andando, desceu as escadas e ela o perdeu de vista.

Ao entrar na biblioteca ela sorriu, observando avidamente todas a obras em todas as estantes, fazendo-o mira-la curiosamente. Finalmente sentou ao seu lado como uma dama, colocou as mãos sobre as coxas e esperou. Martin desviou o olhar do livro por um segundo e fitou-a, voltou sua atenção e finalmente desistiu, colocou-o sobre a mesinha e cruzou os dedos.

– Como?

– Eu...

– Como diabos você teve o filho de um vampiro? Bem, assumindo que tenha sido você a mãe, já que está lá faz tanto tempo.

– Eu não tive filhos, demônios não podem colocar crianças nesse mundo, podem?

– Não, eles não podem, mas aquele babaca falou que tem uma filha – coçou a cabeça, e colocou a mão no rosto, com o olhar distante. – Digamos que é a filha de outra mulher, você chegou a ver a garota?

– Raramente eu saia daquele quarto, só quando... – ficou calada, introspectiva. – Uma vez eu vi uma garota lá, ela parecia ter uns dez anos, loira, ele estava... Quando ela chegou eu estava fora do quarto – voltou à si. – Mas ela não era filha dele.

– Não?

– Ela é um membro do Orus.

– Espera, ele me falou o nome dela, eu anotei aqui – falou revirando os bolsos quase desesperadamente, procurando por um bloco de notas. – Aqui está, Sofia. Ela por acaso falou o nome?

– Eu tenho quase certeza que era esse, ela estava fazendo umas perguntas para ele, algo sobre o Orus.

– E ele simplesmente te deixava ouvir uma conversa sobre o Orus?

– Ele falava que quando conseguisse entrar para a elite ia me transformar em um vampiro e que iríamos viver lá.

– Esse cara... Isso é doentio. Mas isso me livra de precisar entender como ele podia ter filhos, ele não podia, um mistério a menos. Será que você poderia chamar Irwin? Preciso falar com ele urgentemente.

– Ele saiu.

– Ah, sim, eu pedi para ele sair. Tudo bem, amanhã falo com ele, muito obrigado pela informação, isso vai me ajudar muito.

Martin se sentou e passou as mãos no rosto sentindo sono, se arrependendo de ter ficado até tarde na biblioteca. As janelas estavam abertas e sentiu frio, colocou rapidamente uma camisa e foi até as escadas, esperando que as amigas de sua esposa não estivessem ali novamente. Foi até a mesa para tomar o café da manhã, no caminho encontrou Rose e Irwin na sala, aguardando-o.

– Imagino que isso seja sobre eu estar te expulsando daqui, querida.

– Bem, é mais sobre você ter falado para ele arrumar um lugar no bordel...

– Ah, isso, desculpe, mas eu o convenci de que era uma má ideia e agora você vai para... – respondeu sorrindo.

– Elas vão ficar na casa do meu irmão, não é nada luxuoso, mas vocês vão estar seguras – Irwin completou.

– Viu, eu tenho tudo planejado – foram até a entrada.

– Claro querido, então acho que é isso, quando você vai me visitar? – falou calma enquanto segurava as mãos dele com força.

– Quando tiver terminado com isso, é perigoso demais aparecer lá, tenho motivos para acreditar que já saibam que sou eu, então precisamos tomar muito cuidado agora.

– Tudo bem – falou parecendo triste. – Não se arrisque demais, tudo bem querido?

– Ei, eu já te desapontei?

– Não, você nunca me desapontou – ela sorriu. – Só espero que essa não seja a primeira vez.

– Eu prometi que nunca deixaria alguém te machucar – suspirou. – Eu sinto muito, mas se algo acontecesse com você eu morreria. Eu não conseguiria terminar o que comecei sabendo que isso te colocaria em risco.

– Eu sei meu amor – passou os dedos finos no rosto do marido, acariciando-o. – Aconteça o que acontecer, eu te amo – Beijou-o apaixonada, ainda com a mão em seu rosto. – Eu quero você de volta, não importa o que tenha acontecido com você. Você pode me prometer isso? – Assentiu. – Nos veremos de novo querido, é uma promessa.

Ela saiu com Irwin e Martin foi para a mesa comer. Já de tarde o colega voltou e sentou ao seu lado biblioteca, esperando que ele desviasse a atenção do livro.

– Ainda bem que tiramos ela daqui.

– Por quê?

– Finalmente temos uma pista para encontrar o Orus, acho que finalmente conseguiremos o nome do desgraçado, estamos mais perto que nunca!

– Isso é ótimo, só precisa me explicar agora – comentou alegre.

– A garota, Sofia, ela é um membro do Orus, provavelmente deveria entrar em contato com ele em breve, hoje nós vamos desafiar eles de novo, mas dessa vez eu sei quem vai aparecer.

– Acha mesmo que ela vai se arriscar?

– Eles não tem mais a quem recorrer, só resta enviar o próprio grupo interno para me matar, eles são os que treinaram e vivem há milhares de anos, esses sim são perigosos.

– E nós vamos desafiar eles hoje à noite.

– Isso mesmo – riu. – nós vamos para o açougue durante a noite, eles provavelmente estarão nos esperando, nós vamos entrar na armadilha, acabar com todos eles e descobrir o nome!

– Quando você fala parece tão fácil que quase me faz esquecer que somos suicidas em potencial – sorriu. – Vamos precisar nos defender com tudo hoje.

– Estaremos preparados – suspirou. – Helena ainda está aqui? – ele assentiu. – Aproveite o dia para levá-la para casa e peça para não falar para ninguém o que aconteceu, para o bem dela.

– Farei isso.

Havia pouca luz e o frio estava intenso o suficiente para fazê-lo sentir dentro daquela armadura. Carregavam o carrinho de noites passadas quando chegaram na rua em que ficava o açougue, repensando sobre como agiriam. Martin pegou frascos cheios de água e dividiu com o colega, jogaram-no por todo o corpo e encharcaram as luvas.

– Você está pronto?

– Quando quiser.

Caminharam tentando não parecer completamente nervosos sob a lua que brilhava sem muita luz. Havia um lampião preso ao carrinho que só permitia uma visão quase nítida da rua ao chegar perto demais. Finalmente pararam ao lado do açougue, imaginando que surgiriam de todos os lados à qualquer momento. Esperaram por longos minutos de tensão sem sorte – quando se considera ser atacado por demônios sorte.

– Eu vou entrar – Martin falou.

Antes que o colega pudesse tentar impedir ele abriu a porta e percebeu que havia luz vindo da parte de trás. Caminhou sem muita atenção, ansioso para encontrar quem estivesse ali. Para seguí-lo Irwin precisou deixar o carrinho, entraram e ali estava a garota, usando um manto negro que cobria sua cabeça e carregando uma lança maior que ela, com um cabo curto e duas lâminas de aproximadamente quarenta centímetros cada nas extremidades.

– Então é isso, eles mandam uma garotinha?

– Esse comentário já ficou repetitivo, quer tentar outro?

– Hm, Sofia é seu nome de verdade?

– Não, meu nome de batismo é Natalie, mas eu respondo por Sofia agora. Algo mais que queira saber antes de acabarmos com isso?

– Sim, tem uma coisa. Quem é o seu patrono?

– Então é verdade, você está tentando descobrir como nos exorcizar? Bem, eu sinto muito, mas sou só a exterminadora.

– Então imagino que tenha vindo aqui se livrar de nós – falou brandindo a espada que estava presa em sua cintura – eu realmente não gosto de precisar lutar com uma menina de dez anos.

Ela pareceu nervosa, se colocou em posição de combate, segurando a lança com as duas mãos, com uma postura inclinada e pés muito afastados. Martin atirou uma faca contra ela que conseguiu esquivar para a direita com facilidade, Irwin tentou perfurá-la com a lâmina, mas ela desviou parecendo dançar ao seu redor, dirigiu a ponta da lança para o peito dele, mas este se jogou para trás e por pouco saiu do alcance da arma.

Martin tentou atacá-la pelas costas mas foi surpreendido por uma defesa rápida que quase o fez soltar a espada, então ela virou a arma para atacar com a outra ponta e ele defendeu-se. Ela manteve o ritmo de ataque enquanto ele desviava, quando Irwin conseguiu se levantar ela atirou a lança em sua direção, mas ele conseguiu evitar por pouco, sofrendo um corte de raspão no ombro.

Ela então deu um soco rápido em Martin que estava desatento, rachando a máscara e fazendo-o cambalear para trás, chutou seu joelho e usou-o para ganhar impulso e ir na direção da arma, Irwin tentou acertá-la, mas ela passou por cima da espada em um salto tão bem executado que o deixou impressionado. Caiu e colocou-se com um joelho e um pé no chão, brandindo a arma na direção deles.

– Ela é boa – comentou verificando o ferimento.

– Ela não é boa, ela está nos dando uma surra. Uma garotinha está dando uma surra em dois homens adultos, isso está errado!

Ela saltou na direção deles novamente e se afastaram, deixando-a cair à sua frente. Desferiu três golpes tão rápidos que se surpreenderam por conseguir defender, Martin chutou a perna dela, ao cair de costas no chão, Sofia conseguiu parar com sua lança a espada do homem que vinha em sua direção, chutou-o no rosto e deu uma cambalhota para trás, ficando de pé novamente.

Aproveitou que ele estava desorientado e preparou para atacá-lo, com a arma ao seu lado, mirando o estômago dele. Quando chegou perto o suficiente ele fez um sinal com a mão para que parasse rapidamente, ela o ignorou e continuou o movimento até sentir seu rosto arder como o inferno. Caiu no chão gemendo e coçando o rosto com as mãos.

– Alho em pó, você consegue derrubar dois homens adultos mas não aguenta um pouco de alho na cara, é bem triste isso, se quer saber.

Pegaram a cadeira e a fizeram se sentar, amarraram suas mãos quase com pena, enquanto agonizava com o rosto queimando. Finalmente Martin jogou água em seu rosto que aliviou a dor e lavou o pó, acalmando-a. Ela inspirou furiosamente, desviando o olhar para todos os lados enquanto seu rosto se recuperava das queimaduras com uma névoa negra o encobrindo. Pensaram em tirar as máscaras para interrogá-la, mas decidiram não o fazer.

– O que te faz pensar que eu não consigo me soltar?

– O fato de eu e meu colega termos pó de alho e água benta aqui, se eu soprar isso em você vai sentir tanta dor que vamos poder te prender de novo. Agora, nós podemos fazer isso do jeito humano, que é pessoalmente meu favorito, ou podemos te torturar.

– Você não torturaria uma criança, torturaria?

– Hm, eu pareço alguém que não tortura crianças? – Irwin assentiu. – Eu tenho que trabalhar minha pose de vilão então. Bem, sejamos claros, eu não me importo muito com o que preciso torturar para conseguir o que quero, se isso inclui torturar uma vampira que parece uma criança, que assim seja – ela revirou os olhos. – Vamos começar, qual o nome do seu patrono?

– Behemoth.

– Já?

– Uh-hum – respondeu. – Mês retrasado, aquela louca com um machado que estava escondida na igreja da cidade vizinha.

– Vamos, tente outro, nós temos tempo.

– Eu disse que não sei, só os cinco sabem o nome verdadeiro!

– Bem, então vamos mudar um pouco como fazemos as coisas. Onde está o Orus?

– Eu não...

– Vamos acabar logo com isso, você sabe que vai acabar falando, torturar um vampiro é infinitamente mais fácil que torturar uma pessoa qualquer, bem, depois que você tem ele amarrado, é claro. Nós só precisamos jogar um pouco disso – falou enquanto salpicava pó de alho no braço dela – e esperar um pouco.

Ela trincou os dentes tentando não gritar enquanto a queimadura surgia em sua pele, como se a deixasse sobre o fogo intenso. Bolhas cresceram e explodiram antes de ela pedir que parassem com aquilo. Ele jogou um pouco de água e a queimadura parou, voltando ao normal.

– Então, onde está o Orus? – a voz de Martin pareceu falhar.

– Eu nunca vou falar!

– Eu estava errado, torturar crianças não é meu forte, será que você poderia fazer isso por mim? – falou fitando o colega, ele assentiu. – Ótimo, eu vou esperar do lado de fora – falou saindo do lugar apressado.

Sentou no chão e levou a mão à mascara, sentiu as rachaduras e pensou em tirá-la, desistiu e simplesmente ficou observando tudo ao redor. Ouviu um grito de dor, imaginou o que o colega faria com ela, sentiu-se mal. Ela parecia ter dez anos, não importando o que tivesse acontecido a ela, era uma garotinha que fora amaldiçoada cedo demais, provavelmente desde seu nascimento fora usada como arma por aquele grupo, sentiu raiva.

Finalmente Irwin e sentou ao seu lado, quase uma hora havia se passado.

– E então?

– A mansão dos Dheli, é lá que eles vivem.

– Você tem certeza disso? Não é um lugar tão fortificado assim, apesar de ser bem protegido da luz solar. Na verdade, faz sentido, o que eu estava esperando? Um castelo antigo? – deixou escapar uma risada seca.

– O que faremos com ela?

– Vamos levá-la para a igreja, vamos poder ajudá-la depois que tudo isso tiver acabado – suspirou. – E já que vamos arriscar tudo muito em breve, pode ser uma boa hora para ver sua irmã.

– Lily... – sua voz estava rouca. – Tudo bem, vamos para a igreja.

Amarraram Sofia e prenderam-na no carrinho que empurravam, caminhando sob a luz do luar e rezando para não encontrar nenhum inimigo no caminho. Pararam de frente para a igreja e bateram na porta. O homem que abriu era alto e desengonçado, tinha cabelos loiros muito claros e longos, usava a bata comum de um padre e em sua mão carregava uma cruz com a parte de baixo afiada. Eles tiraram as máscaras e ao perceber quem era, ele mexeu o cabelo para o lado, tinha olhos verdes. Convidou-os para entrar, colocaram a vampira sentada em um dos bancos.

– Eu não posso ficar prendendo tantos deles aqui... – começou a falar, sua voz era grave.

– É só essa, acabamos de prendê-la, tem informação valiosa sobre o Orus, não podemos simplesmente matá-la – Martin falou. – E... Ela era muito nova quando aconteceu, eu sinto pena dela, quero dar uma segunda chance para a garota.

– Eu entendo, mas isso é muito perigoso, se o vaticano descobrir...

– Não se preocupe, isso tudo vai acabar logo, descobrimos onde eles estão, eu vou conseguir curar a maldição, Lionel – estava sorridente. – Finalmente vamos poder acabar com isso. Vamos salvar Lily, destruir o Orus e libertar todos eles!

– Você... Você descobriu o nome? – perguntou abobalhado.

– Ainda não, mas sabemos onde eles estão, eu já tenho tudo planejado, não se preocupe.

– Entendo... Acho que posso mantê-la aqui por algum tempo, uma semana no máximo.

– Não vai ser necessário tanto tempo – ele assentiu. – Será que podemos ver Lily?

Irwin carregou Sofia no ombro enquanto se dirigiam para a parte de trás do púlpito, onde abriram uma passagem que levava ao subsolo. O lugar era úmido e fedia, havia tochas espalhadas pelo corredor que levava a um cômodo retangular onde estavam dispostas sete celas com grades de metal desgastado.

Ele abriu uma delas e Irwin colocou a garota lá, então saíram e colocando as mãos entre as grades desamarrou-a. Ela tirou o pedaço de pano da boca.

– O que estão fazendo? – perguntou furiosa.

– Você vai ficar aqui até descobrirmos como curar o vampirismo.

– Não podem fazer isso, eu vou morrer aqui!

– Não se preocupe, vocês não podem morrer aqui, não há madeira para perfurarem os corações nem prata para cortar a cabeça, vai ficar louca de fome, mas a maldição vai manter você viva – sorriu. – Não se preocupe, tudo isso vai acabar.

– Eu tenho duzentos anos – ela falou baixo, como se estivesse preocupada. – Quando eu voltar a ser humana, eu vou morrer?

– Não sei – ele falou em tom condescendente. – Eu espero que não.

– Eu também – ela pareceu sussurrar antes de se deitar no canto abraçando os joelhos e tentando descansar. A imagem o surpreendeu.

– Lily está aqui, ela está mais calma ultimamente, mas a fome está torturando, eu... – o homem franziu o cenho, seus olhos pareceram querer deixar lágrimas escaparem. – Eu não sei o que fazer, todas as noites ela fica se machucando, tentando se matar, mas ela sempre volta... Eu não consigo ver isso noite após noite!

– Nós vamos cuidar dela, em breve nossa Lily estará de volta, não se preocupe – Martin falou com um olhar sombrio. – Eu prometi e mesmo que seja a última coisa que eu faça, eu vou trazer ela de volta – tentou esboçar um sorriso. Se aproximou da cela onde estava a moça raquítica de longos cabelos ruivos sujos e olhos castanhos. – Ei, você lembra de mim?

Ela grunhiu como um animal, se aproximou e rosnou para ele, então voltou para o fundo.

– Ela não fala nada faz dois meses.

– Será que nós podemos... – Irwin falou quase gaguejando, tentando conter os soluços.

– Sim, vamos para cima, já fizemos o que tínhamos para fazer aqui – Martin falou completando, colocou a mão no ombro do amigo e subiram as escadas. – Acho melhor voltarmos, ele precisa de um tempo, fazia tempo que não via ela e... A situação não está boa, nós vamos lidar com tudo isso o mais rápido que pudermos.

– Eu entendo, é de uma tristeza fúnebre ver aquela garota assim, eu tento lembrar de como era a menina alegre que conhecíamos – Lionel abraçou Irwin. – Ei, aconteça o que acontecer, lembre-se dela, é como Lily gostaria de ser lembrada.

– Obrigado – disse logo antes de se afastar e ir esperar quieto perto da porta, colocando a máscara de volta.

– Nós vamos tentar terminar tudo isso em breve, se eu não voltar até o fim da semana quero que procure o irmão dele, Rose está escondida com ele, diga que eu sinto muito por ter quebrado minha promessa.

– Eu farei isso – apertou a mão dele. – Que deus ilumine sua batalha, Martin, pois ela glorifica seu nome – soltou sua mão e fez uma breve oração enquanto fazia o símbolo do pai, filho e Espírito Santo. Saíram então empurrando o carrinho e voltaram para casa, onde tentaram descansar.

Irwin usava uma camiseta cavada branca e uma calça preta quando chegou na biblioteca da casa, tinha uma faixa cobrindo o ombro direito, coçou a barba malfeita e esfregou os olhos, tinha olheiras profundas. Sentou ao lado do colega e prestou atenção ao aparelho no que trabalhava.

– O que é isso? – fitava a bola de cobre com uma chave ao lado para dar corda.

– É uma bomba! – Irwin se assustou com o anúncio e sentiu vontade de se afastar, mas ficou quieto observando.

– Então nós vamos explodir nosso caminho para o Orus?

– Eu pareço o tipo de homem que explode o caminho para alguma coisa? – sorriu. – Não, isso é o que vai fazer eles nos falarem o nome do maldito. Como eu disse, tenho tudo planejado.

– O que vamos fazer?

– Hoje você vai vigiar a mansão e descobrir onde moram os mordomos, dois deles, de preferência, nós vamos nos passar por eles para entrar lá, eles devem ter as chaves, então só precisamos dizer que somos recém-contratados deles.

– Os mordomos não são vampiros também?

– Bem... Eu não sei, é por isso que vai precisar ficar vigiando a casa, eu vou continuar trabalhando nessa bomba, logo vamos colocar tudo em prática dependendo do que você conseguir descobrir, o que acha?

– Saio logo depois do almoço, vou tentar descansar de verdade antes de ir, dormi muito mal.

– Percebe-se... Ei, não se preocupe, ela estará de volta antes que possa perceber, só precisamos fazer isso direito, tudo bem?

– Você fala como se não fôssemos invadir uma mansão cheia de vampiros.

– A sorte está sorrindo muito para nós ultimamente, temos que aproveitar, colega – riu. – Não esperávamos ter tanta sorte ontem, esperávamos?

– Talvez você tenha razão – concordou. – Mas seria mais fácil te levar a sério se não estivesse brincando com uma bomba e rindo enquanto falamos de uma missão suicida.

– Provavelmente – suspirou. – Agora vá descansar logo, teremos pouco tempo para isso muito em breve – ele saiu pela porta e foi para seu quarto.

Martin colocou a bomba cuidadosamente na maleta, então preencheu os outros espaços com saquinhos de pano cheios de pó de alho e alguns frascos com água benta. Organizou as facas e estacas cuidadosamente esculpidas em outro compartimento da mesma maleta e finalmente fechou-a, o estalo ecoou por toda a casa vazia. Irwin também terminou de arrumar a sua e inspirou fundo, soltando o ar lentamente.

– Eu quero fumar.

– Você sabe que... Aqui está – tirou o cachimbo do bolso e entregou para ele, ascendeu um fósforo e lhe entregou. – Só não exagere.

– Se eu não me acalmar terei um ataque antes de chegarmos.

– Eu sei.

– Você parece bem calmo.

– E... Eu pareço? – levantou a mão e observou-a, tremia levemente.

– Hm... Quer um pouco?

– Não, isso me deixa mal, não posso me dar o luxo de fumar hoje – suspirou.

Deixaram as malas sobre a cama e começaram a se despir, ignorando um ao outro. Colocaram então os ternos finos que Irwin trouxera, tinham um cheiro estranho que Martin não conseguia identificar. Após estarem completamente vestidos eles colocaram as máscaras completamente brancas e sem vida em seus rostos.

Todos os mordomos usam máscaras, o cara que eu matei falou que os cinco não gostam de ver os rostos da plebe, é melhor que fiquem escondidos atrás de máscaras para que não precisem sujar o olhar com ratos, algo assim – Lembrou do colega falando na noite anterior, após estudar a mansão durante toda a madrugada pela segunda vez.

Pegaram as coisas e ficaram de frente para a porta, observando-a aberta e pensando sobre tudo que acontecera, se entreolharam e saíram calmamente, fechando-a atrás de si e caminhando até o extremo oeste da cidade, onde estava a mansão dos Dheli. Analisaram o local, parecia haver homens nos telhados das casas próximas – que na maioria eram abandonadas. Martin entendeu rápido que a única coisa entre eles e a morte era a máscara branca.

Andaram com as maletas pelas ruas escuras se sentindo mal, havia pouca luz e sombras se moviam pelos becos, o bairro inteiro havia sido tomado por vampiros e ninguém havia notado. Pela primeira vez desde que primeiro enfrentaram um deles, tinham medo de serem impotentes contra a ameaça que espreitava naquele lugar.

Finalmente chegaram ao portão principal que daria na mansão, a distância entre este e a mansão em si não era tão grande, aproximadamente de uma rua. Irwin tirou algumas chaves do bolso e estudou-as rapidamente, escolheu uma e encaixou na fechadura, o portão abriu rangendo e por um segundo tudo ficou quieto, voltando ao normal som de passos solitários e respiração pesada apenas depois de terem entrado no território do Orus.

Caminharam com calma até o canto do lugar, a casa tinha pilares de madeira enormes que sustentavam a sacada do segundo andar, as janelas eram de vidro, mas este era mais escuro que o normal, além de estarem cobertos com cortinas grossas por dentro. As paredes eram altas e o lugar parecia mais perigoso conforme se aproximavam. Deram a volta e chegaram aos fundos, a parte de trás da propriedade se estendia até onde conseguiam ver, adentrando a floresta, a grama ali era alta e  provavelmente ninguém a cortava, diferente da entrada.

Abriram a porta dos fundos e entraram na mansão pela cozinha, vários dos que estavam lá os estudaram por alguns segundos e então voltaram aos seus trabalhos normais. Um homem cujo terno era diferente – possuía detalhes vermelhos nos ombros, pescoço e botões – se aproximou, sua máscara também era diferenciada, tinha um "x" marcado com sangue na bochecha.

– Ah, então devem ser vocês, quem diria que os cinco trabalham rápido assim – falou animado. – Nesse caso, Anabele! Venha aqui! – uma mulher que usava o uniforme padrão se aproximou, ela tinha cabelo loiro por trás da máscara. – Você não precisará levar o jantar hoje, se esses são os novos empregados é melhor que eles façam isso, algo me diz que estão ansiosos para conhecê-los – riu sarcasticamente. – Quais são seus nomes?

– Eu sou Lucas – Martin falou. – Este é John – tentou falar o mais rápido possível, para não parecer que estava escolhendo nomes aleatórios.

– Sejam bem vindos, aposto que se darão muito bem com nossos senhores – riu mais uma vez. – Me desculpem, Anabele, será que poderia levar eles para as refeições? Falta pouco para... O que são essas maletas? – perguntou desconfiado.

– Nossas roupas...

– Ah, tudo bem, continuando, prepare eles para levarem comida lá para cima, é melhor não se atrasarem – pigarreou fitando um homem que passava por ele e este saiu apressado. – Boa sorte rapazes, a primeira noite de trabalho aqui é inesquecível, vão descobrir logo! – e saiu andando pela cozinha enquanto ria.

Seguiram a garota até uma sala menor onde havia uma mesa repleta de bandejas de ouro ornamentadas com leões e dragões. Martin fitou-as por um bom tempo, admirando.

– É japonês – ela abriu uma, tinha uma tigela cheia de sangue. – Eu acho a arte japonesa linda, você conhece arte japonesa, Lucas?

– Ah, sim, já vi um pouco, tenho admiração especial pelas katanas.

– Oh, sim, são lindas – ela parecia desajeitada, o cabelo loiro balançava livremente. – Aqui está o que vão levar agora, eles preferem pular aperitivos desnecessários e ir direto ao prato principal, você tem que servi-los pela parte da mesa onde não tem nenhuma cadeira, se fizer errado eles vão se irritar – sua voz pareceu tremer quando falou disso. – Como é a primeira vez de vocês não precisam ficar tão preocupados, só tente ser cortês...

– E onde é a sala de jantar? – Irwin comentou coçando o cabelo.

– Ah, havia esquecido completamente disso, senhor John – ele desviou o olhar. – A sala de jantar fica no segundo andar, eles só ficam lá em cima, por segurança. Basta encontrar as escadas e subir, é o primeiro cômodo à direita, quando chegarem lá eles já devem estar esperando.

– Bem, vamos logo, não queremos deixar eles esperando, não é mesmo John? – Ele assentiu. – Muito obrigado Anabele.

Ela saiu do aposento, Martin esperou para ver se voltaria ou se mais alguém surgiria, então tirou a tigela de dentro da bandeja que carregaria e colocou ali dentro a bomba, mantendo perto dele o fio que deveria ser puxado para detoná-la. Irwin tomou outra – que tinha uma tigela cheia de sangue dentro – e abriu a porta. Saíram temerosos do cômodo e foram de encontro às escadas.

O interior da mansão tinha piso de madeira e longos tapetes vermelhos que cobriam praticamente todo o chão, as paredes tinham uma pintura cor de vinho que mesmo iluminada pelos candelabros espalhados em todo lugar parecia muito fria. Subiram os degraus apreensivos, tentando manter a calma. Irwin agradeceu por estar atrás daquela máscara, seu rosto provavelmente teria uma expressão indescritível de nervosismo.

Abriram a porta devagar, estudando o cômodo antes de entrar. Era uma sala quadrada sem janela alguma, havia uma mesa em forma de aro circular ao redor de uma mesa menor redonda, na exterior havia um espaço, era por ali que deveria colocar a bandeja de ouro oriental. Cinco pessoas estavam sentadas ali, eram três homens e duas mulheres, todos pálidos e de cabelos loiros.

Observaram calados enquanto ele preparava a bandeja e se afastava, Irwin fechou a porta antes de entrar e continuaram quietos, agora parecendo impacientes, enquanto ele ficava imóvel diante deles. Um deles finalmente ergueu uma sobrancelha, era o último à direita.

– O que diabos está fazendo? Sirva nossos pratos logo!

– Eu estava aqui pensando... Vocês parecem só vampiros normais, não parecem grande coisa, o poderoso Orus – riu. – Vocês são tão inúteis quanto todos os outros – retirou a máscara por um segundo para que observassem, então colocou-a de volta.

– Martin Wilde, devo dizer que estou impressionado por vê-lo chegar tão longe – falou o do meio, ele usava terno preto e gravata azul, tinha cabelo cumprido, caindo nos ombros, e olhos azuis profundos. Tinha um sorriso fino e ameaçador.

– E você seria...

– Ah, permita-me apresentar minha humilde família, caçador. Me chamo Guilhermo De La Fontana, fundador do Orus, estes são meus irmãos adotivos, Isaac e Lucio, estas são Marie e Nora – fizeram um gesto com a cabeça. – Seria muita arrogância dizer que estávamos te esperando, mas imaginava que isso aconteceria mais cedo ou mais tarde.

– E não se preparou?

– Apesar de ter plena confiança em suas habilidades, não acredito que elas serão suficiente para completar a jornada que começou – suspirou e ajeitou o cabelo. – É uma pena, poderia ter se unido a nós, imagine as grandezas que conseguiria como um de nossa espécie.

– Vocês não são uma espécie – falou sem apreensão. – Vocês são o fruto de uma maldição, só estão vivos porque um demônio quer que estejam, não seja arrogante quando sua alma está nas mãos de outro.

– Você tem um belo ponto de vista, devo dizer, infelizmente ele te impede de ser nosso aliado... – pigarreou. – Bem, apesar de gostar muito dessa bela confraternização, poderia se apressar? Temos um jantar esperando – Martin retirou a tampa da bandeja e o vampiro pareceu surpreso. – Ora, você não é cheio de truques? Onde você conseguiu algo assim?

– Eu construí.

– Droga, assim você me deixa triste por ter que matá-lo – riu. – Vejamos, então ou eu falo o nome do nosso patrono ou você usa isso e todos nós morremos?

– Eu pareço um suicida?

– De fato você não parece um suicida, muito menos alguém que invade a mansão dos Dheli despreparado, devo imaginar que isso vai soltar água benta em todos nós?

– Pó de alho.

– Ah, muito inteligente, assim nós vamos agonizar enquanto você sai ileso – sorriu. – Vê irmã? É por isso que eu não o queria morto!

– Para que ele pudesse vir aqui e nos torturar?

– Não, para convidá-lo – estava sorridente. – Saiba que não sou tolo, não espero realmente que você aceite minha proposta, mas não poderia deixá-lo ir sem tentar, você é a única pessoa que me interessou nesta cidade inteira – coçou a cabeça – você é astuto, e isso é muito importante para nós – observou os irmãos com desdém – até necessário, eu diria.

– Sinto-me lisonjeado, mas recusarei a oferta – deu de ombros. – Não é nada pessoal, só não estou no humor para dar minha alma para um demônio.

– Hm, é realmente uma pena – estendeu a mão subitamente – então tratemos de negócios, o que você deseja? – nesse momento os irmãos já pareciam irritados com a atitude de Guilhermo.

– O nome de seu patrono – exibiu o fio.

– Ah, sim, isso... Bem, seria injusto deixar isso acabar sem que você soubesse o nome de nosso querido pai – deu de ombros. – O nome dele é Lamia.

– Guilher...! – Nora começou a reclamar, ele estendeu a mão e ela se calou.

– Lamia – pareceu pensativo. – Isso é Latim...

– Exato, está satisfeito agora?

– Com isso... Por que você me falou o nome dele?

– Porque ambos sabemos que você não vai sair dessa casa com vida, se vai morrer, que tenha ao menos a satisfação de saber o nome, e a tristeza de nunca poder usá-lo para salvar as almas perdidas – sorriu. – E se Lamia quiser, que não haja outro caçador tão estupidamente brilhante como você no mundo.

– Irwin! – gritou logo antes de puxar o fio e o alho se espalhar como uma cortina de fumaça. O colega atravessou o coração dos dois vampiros à direita, dissipando-os em cinzas. Martin saltou sobre a mesa e caiu no chão derrubando as cadeiras dos dois vampiros à esquerda, enfiou a mão nos bolsos e cravou duas estacas no coração deles – Você vive, eu lhe devo isso – falou para Guilhermo enquanto este agonizava debruçado sobre a mesa. – Nós temos que ir!

Correram rapidamente pela casa, tudo parecia agitado no primeiro andar, mas ninguém subia para ver o que acontecera. Martin imaginou que tinha a ver com o que tanto falavam sobre o primeiro dia trabalhando ali. Trancaram a sala de refeições com o vampiro e desceram para as mesas cheias de bandejas, se equiparam com o que havia nas maletas.

– Alguém assassinou o Orus! – uma voz gritou fora da sala. – Eles mataram os cinco, procurem em todo lugar, temos que achá-los!

No dia anterior haviam encontrado a planta da mansão, existia uma passagem secreta que daria no esgoto, já mais próximo da praça central. A entrada ficava no primeiro andar, um cômodo com sofás e uma lareira. Contaram até três e abriram a porta, um vampiro que estava prestes a entrar foi surpreendido, Martin cravou a estaca em seu peito e correu. Atravessaram o mais rápido que puderam a mansão, ao encontrar a sala os serventes se juntavam, perseguindo-os.

Irwin abriu alguns sacos com pó de alho no ar, as partículas que flutuavam antes de cair no chão encontraram a pele dos perseguidores e lhes atrasou. Conseguiram entrar e fecharam a porta, colocaram os sofás como barricadas e direcionaram o foco para a passagem secreta. Tentaram arrombar a porta e Irwin ficou segurando-a, finalmente o colega puxou o tijolo certo e conseguiu empurrar a lareira para o lado, abrindo um túnel escuro.

– Pegue uma dessas velas, vai precisar de luz – falou com as costas na porta, suando.

– Irwin! Não!

– Você sabe tão bem quanto eu como isso vai acabar se não fizer isso, eles sabem da passagem e não vai ter nada entre nós e eles – suspirou. – Só me prometa que vai conseguir curar Lily.

– Irwin...

– Ei, eu não pretendo fazer disso um adeus – sorriu. – É melhor a sua cura funcionar.

– Eu...

– Diabos Martin, eu fiz tudo que fiz até agora porque acreditava que você ia conseguir curar de uma vez por todas essa maldição, se você morrer eu nunca vou te perdoar! – gritou. – Agora me faça um favor e fique vivo!

– Obrigado, mas você não deveria se preocupar tanto comigo.

– Se algo acontecer com você Rose me mata – riu. – Agora vá, e não esqueça de fechar isso, vou manter eles distraídos por um bom tempo, deve conseguir chegar no centro, de lá vá direto para dentro da igreja, é o lugar mais seguro... Salve Lily, por favor.

– É uma promessa – sorriu. – E eu não sou bom em quebrar promessas – se aproximou e apertou a mão de Irwin. – Espero que não seja, mas se é um adeus, saiba que sentirei saudades. Eu cuidarei de Lily como minha irmã – sorriu enquanto uma lágrima desceu pelo canto de seu olho e entrou no túnel. Fechou-o atrás de si e correu.

Só parou quando o cheiro do esgoto se tornou forte demais, procurou pelas escadas e finalmente saiu do subsolo fétido, esperando que ninguém o aguardasse ali. Observou um pouco, tentando descobrir em que parte da cidade estava, até que reconheceu o sino da igreja ao longe e foi em sua direção cegamente. Bateu à porta ofegante. Lionel abriu e ele entrou, dirigiram-se para o subsolo imediatamente.

– Lamia! – falou alto, todos os vampiros no local pareceram se agitar com o nome. – Se não estiver certo a vida de Irwin terá sido em vão... Não, se estiver errado eu vou descobrir qual é, mas realmente espero que seja esse.

Amanhã poderei tentar o exorcismo, como você sabe, ele precisa ser realizado a... Eu sinto muito por ele.

– Será que posso dormir aqui? Acredito que minha casa não seja um lugar seguro agora.

– Claro, a igreja é pública – falou desanimado. – Pode ficar em meus aposentos.

Agradeceu e subiu as escadas preguiçosamente, sentindo-se cansado e triste. Se odiou, estava perto de cumprir o que definira como objetivo de sua vida cinco anos atrás, mas o preço havia sido alto demais. Sabia que era egoísmo pensar assim, não sacrificara o amigo, e este não se sacrificara apenas por ele, Lily era o centro daquilo tudo. A pequena Lily que tanto ele quanto Lionel ou o irmão queriam ter de volta.

Eu não quero me casar – lembrou dela dizendo aos oito anos. – Mamãe sempre fala de como eu vou ser feliz porque meu marido vai ser feliz, que eu vou ficar em casa cuidando das coisas e das crianças enquanto ele trabalha... Eu quero viver, eu não quero ficar trancada dentro de casa como um troço de fazer e cuidar de criança!

Deixou um sorriso terno escapar de seu rosto. Imaginou que valeria a pena.

Os olhos vermelhos e cansados observavam atentamente a garota de cabelos ruivos amarrada à cadeira ao por do sol. Estavam nos fundos da igreja, onde ninguém poderia incomodá-los. Havia entre a garota e o sol um pano negro e denso preso por um fio entre dois postes de madeira. Lionel começou a recitar pedaços da bíblia.

– Agora! – gritou.

Martin puxou o tecido e deixou os raios de sol tocarem a garota, apreensivo e se sentindo mal por ela que agonizava, rezando para que funcionasse. Sentiu um cheiro familiar, não conseguia lembrar que cheiro era aquele, mas o desprezava.

Um homem surgiu usando um chapéu largo e um sobretudo, tinha um sorriso maligno em seu rosto, como um assassino que ri de suas presas impotentes. Ele tirou da bainha uma katana de prata, exibiu-a com arrogância enquanto se aproximava. Só quando chegou perto demais Martin conseguiu reconhecê-lo, era Guilhermo.

– Você matou meus irmãos – falou pausadamente. – Entrou na minha casa, foi recebido com cortesia e matou meus irmãos! – mexeu no chapéu com a lâmina. – Você é a pessoa mais mal educada que conheço, caça... Quer saber? Dane-se essa maldita pose. Eu não vim aqui te matar, eu vim te fazer sofrer, eu vou jogar fogo no seu rosto e matar as pessoas que você ama – exibiu um sorriso cheio de dentes e olhos esbugalhados. – Eu vou te fazer pagar pelo que fez.

Martin levou a mão à cintura e percebeu que não tinha sua espada consigo, apenas o cinto de facas que havia esquecido de tirar. Sentiu medo.

– Termine o exorcismo – falou tentando manter a calma. – Eu vou cuidar dele.

Contou as facas, eram sete. Atirou a primeira na direção da cabeça do vampiro, mas ele rebateu-a para o lado com a espada. Jogou o chapéu para o lado percebendo que o sol já se escondia atrás das montanhas.

– Vamos ver como você se sai sem seus brinquedos, rato!

O homem correu ao seu encontro, fez o mesmo, para que não se aproximasse tanto de Lily.

Guilhermo investiu com a espada contra Martin, mas este conseguiu esquivar com a lâmina passando ao seu lado, levou uma faca à garganta do vampiro, que defendeu o golpe, tomou a arma e fincou-a na coxa do inimigo. Se afastou e tirou a faca do ferimento, sentiu muita dor, mas agradeceu por não ser um ferimento muito profundo.

Tentou furá-lo com a espada, mas o caçador usou a faca suja com o próprio sangue para rebatê-la à direita, tentou novamente cortar o pescoço do vampiro e este desviou sua mão, então jogou-se para o lado antes que a espada o encontrasse. Atirou a faca no peito do homem, mas ele agarrou-a e jogou de lado. Correu em sua direção.

Martin tentou atirar outra faca nele, esta se agarrou a seu braço, mas não o parou. Conseguiu desviar tarde demais, sofrendo um corte leve no braço esquerdo. O homem investiu contra sua cabeça, mas este deu um golpe sobre a faca que aprofundou o corte no braço, fazendo-o se afastar com dor. Arrancou-a e jogou na direção do caçador, mas errou.

Tentou um golpe em forma de arco com a katana e Martin precisou se jogar para trás tentando não perder o pescoço. Sentiu o desespero percorrer seu corpo, restavam quatro facas, mas não tinha chances contra ele, não usando apenas algumas facas. Rezou silenciosamente e se colocou de pé.

– Seus olhos, dá para perceber – riu sarcasticamente. – Você finalmente percebeu que não tem como sair vivo daqui – exibiu a cicatriz do corte no braço, estava completamente curado.

To Die Is To Find Out If Humanity Ever Conquers Death

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– Eu vou morrer tentando – se forçou a rir. Não queria quebrar a promessa.

Lançou outra faca e esta acertou o peito do homem, ele arrancou-a e jogou de lado, rindo maliciosamente enquanto se aproximava caminhando lentamente. Martin saltou na direção dele e enfiou uma faca na barriga, antes que pudesse reagir a arrancou da pele do inimigo e foi de encontro com seu pescoço, mas este segurou sua mão e o jogou no chão. Se aproximou e colocou a ponta da espada sobre seu pescoço.

– Eu poderia me divertir mais um pouco ou me livrar de você agora – sorriu. – O que acha?

– Vamos lá, está divertido – tentou sorrir, sentindo que seu coração poderia explodir a qualquer momento.

O homem exibiu um sorriso logo antes de ser jogado para o lado brutalmente. Uma sombra tomou forma atrás dele e o caçador pôde reconhecê-lo, sentiu-se tão feliz que lágrimas escorreram de seus olhos. Irwin sorriu de volta e foi andando na direção de Guilhermo. Ainda usava o terno da noite anterior, mas este estava repleto de cortes e marcas.

– Acho que você estava mexendo com meu chefe – falou sarcástico. – Eu me atrasei um pouco, mas vamos resolver isso. Tentarei terminar isso o mais rápido possível.

– Insolente!

Guilhermo pareceu voar na direção dele, brandindo sua espada furiosamente. Ele esperou, desviou para o lado e socou a mão que segurava a espada, então acertou o rosto dele com um gancho de esquerda e finalmente um de direita que o fez cair para o lado. O vampiro se levantou rápido e se recompôs, sentindo falta da espada fez suas garras crescerem. Investiu contra Irwin e fez um corte leve em seu ombro, este desferiu um soco em sua barriga, segurou-o pelo braço e derrubou-o no chão com força.

– Vamos lá, nós dois sabemos que essas unhas de mulheres só servem para crianças e gente velha – sorriu. – Devo admitir, ser um vampiro é legal, vocês são bem mais fortes. Deixa fazer isso bem mais fácil! – Gritou alegremente antes de pisar na cabeça de Guilhermo, esmagando-a.

Soltou a mão dele e foi até a espada que estava caída próxima do corpo que se regenerava com uma névoa negra o circundando. Esperou-o se colocar de pé e preparou-se para usar a espada.

– Como você...

– Ele já matava vampiros antes de virar um – Martin falou sorrindo. – Agora com o corpo de um de vocês, ele não deve ter muita dificuldade.

– É isso, se não fosse a coisa toda de deixar sua alma nas mãos de um demônio, acho que poderia me acostumar com isso – riu.

O homem saltou contra ele, tentando acertá-lo com as garras, mas Irwin desviou para o lado e decepou a mão do vampiro, este se recompôs se afastando e antes que pudesse notar teve a outra mão decepada igualmente.

– Vamos ver – falou ofegante desferindo outro golpe. – Quanto tempo você leva para regenerar se eu fizer picadinho!

Decepou um pedaço de sua perna, então enfiou a espada em seu peito e finalizou decepando sua cabeça. Jogou a espada para o lado e observou-o se desfazer em chamas.

Se aproximou de Martin e ajudou-o a levantar, abraçou-o e pode perceber o quanto estava feliz por vê-lo vivo. Sentia-se igualmente alegre por ter sobrevivido. Só então voltaram sua atenção para Lionel, este terminava o exorcismo e Lily se contorcia na cadeira, até que finalmente uma névoa negra pareceu sair de dentro dela e se dissipar no ar.

– Lily! Você está bem? – Irwin gritou correndo para ela, esquecendo completamente Martin.

– Eu... – A garota tentou formar palavras com certa dificuldade. – Água... Fome.

Levaram-na para dentro no colo e serviram pão e água – que primeiro ajudaram-na a comer e depois ela devorou sozinha, como quem passara fome por anos. Finalmente ela parou um pouco e se recompôs, seu rosto já parecia melhor, seu cabelo tinha brilho de novo e fitou todos que observavam-na atentamente. Sua pele não estava mais pálida e fria, agora as maçãs de seu rosto exibiam novamente o avermelhado que amavam.

– Eu virei um vampiro? – Martin assentiu, pasmo. – E vocês descobriram como exorcizar o vampirismo por minha causa? – Ele assentiu novamente. – Gente, eu amo vocês – falou antes de exibir um sorriso terno que fez tudo aquilo valer a pena. Irwin levantou-se e abraçou-a com lágrimas nos olhos e um sorriso abestalhado.

– Desculpe por ter tentado te matar... – ela sorriu desconcertada. – Eu meio que estava com muita sede, não estava pensando direito.

– Eu sei – abraçou-a mais forte. – Só vamos esquecer tudo que aconteceu, finalmente você pode voltar para casa – sorriu. – Agora tudo vai ficar bem.

Finalmente soltou-a. Parou atrás da cadeira de Martin, colocou a mão em seu ombro.

– Você cumpriu sua promessa. Obrigado.
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Well, como o site não me permitiu terminar na postagem principal, aqui está o fim.
To Die Is To Find Out If Humanity Ever Conquers Death

Acho que sou uma das poucas pessoas que lerão a história até o fim. Realmente cerca de 25 páginas não é brincadeira, mas pelo menos é uma história com início, meio e fim então vale a pena ir até o final.

No geral eu gostei da história. Desenvolvimento bacana e as lutas foram legais, embora eu tenha achado que a última acabou fácil demais. Só teve alguns fatores que me deixaram com um pé atrás. O primeiro foi o fato dele estranhar a possibilidade de um vampiro ter um filho já que dhampirs são tão comuns quantos os "puros sangue" (trocadilho feio, eu sei!). Mas creio que isso foi por causa da origem dos vampiros que você resolveu utilizar na história, que no caso é a possessão por um demônio. Não fui com a cara desse estilo, sou uma pessoa mais tradicional, acho que você optou por esse lado para a história ter um final feliz então tudo bem.

Agora no final teve três coisas que eu realmente não gostei. Primeiro, achei que eles invadiram a mansão muito fácil. Ficou algo muito Equipe Rocket, para um família de vampiros mais superior eu achei que foram muito desleixados. Segundo foi o Guilhermo ter dado o nome do demônio logo de cara. Acho que ficou muito forçado essa cena, um vilão inteligente não daria o nome assim tão fácil. Ainda mais que ele sabia da bomba de pó de alho e que não conseguiria impedir o Martin e o Irwin. E por último foi o fato do Irwin ter deixado o Guilhermo vivo, pra mim foi a atitude mais estúpida da história. Tipo, não havia motivo para deixá-lo vivo, de fato havido motivos para NÃO deixá-lo vivo. Era óbvio que ele iria procurar por vingança, ninguém mata todos os seus irmãos e você decide deixar por isso.

Enfim, como eu disse, no geral eu gostei da história. Somente esse fatores que eu citei que não fui com a cara.

Viva a lenda!



Boa tarde/noite Vincent, fico feliz que tenha gostado da história e vou tentar explicar as partes que te desagradaram para que não fiquem tão estúpidas quanto soou. Sobre terem entrado fácil demais, esperava que isso tenha feito sentido, todos ali percebiam que eles não eram vampiros pelo cheiro, mas também sabiam que dois dos mordomos haviam desaparecido, a história sobre o "primeiro dia de trabalho", é quando o Orus iria transformá-los em vampiros, por isso foi fácil chegar até eles.

Sobre ele ter dado o nome muito facilmente, devo lembrar que o bairro inteiro estava tomado por vampiros preparados para assassinar qualquer humano que entrasse ali? Além da mansão inteira... Ele não esperava que soubessem da passagem, e por isso foi tão arrogante.

E deixá-lo vivo, bem, o cara era o fundador do Orus e se tudo desse certo, não teria como ele fazer muita coisa já que viveria somente para ver o declínio da "raça" que eram os vampiros, já que agora a cura se espalharia e muitos padres poderiam salvá-los, ele o deixou vivo para que sofresse mais, por todo o sofrimento que causou.

Espero que tenha aproveitado as 25 páginas, se não, nada de reembolso  :lol:
To Die Is To Find Out If Humanity Ever Conquers Death

Na verdade eu só achei estúpido a parte de não ter matado o vilão, esse é aspecto dos heróis que eu mais acho irritante. Tipo, eles já tinham matado todos os irmãos do vampiro, deixá-lo vivo seria só mais um empecilho. Outra coisa, mesmo que eles estivessem num meio de uma ilha deserta falar o nome do demônio era simplesmente arriscado demais. O Guilhermo me pareceu aquele tipo do vilão precavido, alguém que não arriscaria tanto assim logo de cara. Acho que se tivesse um embate antes, tipo o que eles tiveram com a Sofia, teria muito mais sentido.

Mas de qualquer forma, eu gostei da história.

Viva a lenda!