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Lavínia

Iniciado por Moon[light], 06/12/2013 às 15:06

06/12/2013 às 15:06 Última edição: 13/12/2013 às 08:45 por Moon[light]
A investigação de um assassinato leva à descoberta de uma série de outros crimes ligados a uma misteriosa garota.

Spoiler
Era um fim de tarde em que o frio da noite hesitava e chegar. Nas ruas, as pessoas, apressadas, corriam de volta para suas casas. O trânsito na metrópole começava a congestionar e os ônibus lotados se arrastavam pelas vidas como baleias indigestas. Naquele lento fim de tarde, eu cheguei ao minúsculo restaurante aonde havia marcado o encontro bem antes da pessoa que me convidara. Não que isso me surpreendesse. Alguém como ele jamais chegaria na hora de todo jeito.
O garçom se aproximou da mesa em que eu estava e me entregou o cardápio. Pedi uma água e disse que estava esperando por alguém. A tarde avançou, a noite começou a pintar o céu da e só então vi meu amigo entrar no restaurante, vestido com a jaqueta jeans surrada de sempre, andando como quem fosse a pessoa mais fenomenal do mundo. Levantei minha mão para que ele me encontrasse. Vendo-me, ele ergueu a mão num cumprimento simples e sentou-se à minha frente.
— Jack — falei estendendo-lhe a mão.
— Daniel — disse e retribuiu.
O garçom achegou-se de novo para entregar um cardápio a Jack, ele, contudo, recusou e, sem pensar muito, pediu um hambúrguer e uma cerveja. Aproveitei para pedir uma massa. O garçom recolheu os cardápios e foi-se para atender alguma outra mesa. Uma vez o garçom longe, Jack ficou encarando os cantos do restaurante por uns momentos, como estivesse tentando encontrar alguém ou alguma coisa que tinha esquecido por ali.
— Por que aqui? — ele me perguntou. — Têm civis demais.
— Não se preocupe com eles. Esse é um restaurante pequeno numa avenida importante em plena hora do rush. As pessoas só querem beber um pouco e esquecer o dia. Mas, me diz, por que você me chamou?
Jack sorriu. Prendi o ar e endureci os músculos. Lá vinha uma das fortes.
— Parece que um Bakargy veio para cá — ele começou a explicar. — Um exilado. Se meteu em problemas, resolveu fugir. Não dava para deixar a chance escapar, então resolvi pedir uma mão ao dono da casa para encurralar o morcego.
— A cidade não é minha — corrigi. — Eu estou mais para um caseiro do que para um dono.
— Qual é! Você toma conta disso aqui tem dois anos já. A cidade é sua.
Tentei fingir um sorriso. Acabei me lembrando dela, da verdadeira dona da cidade. Ainda conseguia senti-la na minha mão direita.
— Dois anos...
O garçom chegou com a comida. Jack abriu a cerveja e começou a beber direto da lata. Metade foi para dentro da garganta no primeiro gole.
— Mas, e aí? — ele falou. — Pronto para bancar o Van Helsing?
Esfreguei as mãos no rosto tentando limpar a cabeça. Jack me fitava com olhos de cachorro curioso.
— O que está pegando? — ele me perguntou.
— Tive um caso complicado esses dias.
— Mulher?
— Não esse tipo de caso. Mas, é, tinha uma garota.
— Sabia.
— É mais complicado que isso — expliquei.
— Eu sou todo ouvidos, Dan.
Engoli metade do copo d'água para tentar ajeitar as ideias. A história começou a voltar à minha cabeça.
— Vai ser um pouco longo. A coisa toda começou no fim do mês passado. Estava na internet quando dei de cara com um post estranho num board. Era um sujeito pedindo ajuda, falando que uma garota estava atrás dele, ele não sabia o que fazer e estava com medo. Não deu uma hora tinha uma tonelada de mensagens fazendo piada com o cara enquanto ele tentava dizer que era sério.  Na hora eu nem me importei com isso. Sempre tem um idiota fazendo algo do tipo na internet. Com o tempo você começa a parar de levar tudo isso a sério e simplesmente ignora. O problema é que nessa mesma noite a Máquina do Mundo deu sinal de que alguma coisa estava errada.
— Máquina do Mundo? — Jack interrompeu.
— É só um apelido. Lembra daquilo que eu usei para te encontrar quando nos conhecemos? O localizador de anomalias.
— Ah, o mapa. 
— É. Bom, de qualquer jeito, alguma coisa estava errada. Tinha que ir atrás disso. Peguei uma jaqueta, a Máquina do Mundo e fui atrás. Estava um pouco longe, acabei demorando para chegar lá. O lugar era um condomínio fechado, alta categoria, muitos seguranças. Foi um problema entrar lá. Tive que pular um muro de uns cinco metros e me pendurar numa árvore para entrar sem que eles me vissem. Ainda não sei como eles não me escutaram, mas não importa. Já era mais de dez horas, não tinha quase ninguém fora de casa e os vigias só rondavam as entradas. Chegar na casa foi fácil. A porta estava trancada, mas uma janela no segundo andar estava aberta. Pelo menos isso não foi difícil de alcançar.
— Espera, espera! — Jack interrompeu outra vez. — Quantos metros eram?
— Quatro, eu acho. Mas não tinha guardas para atrapalhar.
— Você disse que foi fácil pular quatro metros?
— Estou controlando melhor a magia. Se eu precisasse mesmo, acho que conseguiria pular uns dez metros na vertical.
Jack ergueu as sobrancelhas parecendo surpreso. Ele terminou a cerveja e pediu outra ao garçom, que não pareceu muito feliz, mas trouxe a bebida mesmo assim.
— Você não devia beber assim — comentei. — Isso é um restaurante, não um bar.
— Tem cerveja, é um bar.
— Tem cerveja na casa do meu pai.
— Não sabia que seu pai tinha um bar.
Cruzei os braços.
— Tudo bem — falei. — Só não espere que eu te carregue.
— Eu não espero, eu sei que você vai.
— Não, não vou.
— Vai. Você sabe que vai. Você não resiste ao meu charme etílico.
— Vai se ferrar.
Jack começou a rir enquanto bebia.
— E aí, o que aconteceu na casa? — ele perguntou.
Bebi mais um pouco de água. Precisava refrescar minha memória. Engraçado, eu ainda sentia tudo tão claramente na minha pele e ainda assim as imagens apareciam embaralhadas.
— O dono da casa estava morto. Não. Destroçado descreve melhor. Parecia que um animal tinha atacado ele. Era como uma cena de Sade. Tinha uma poça de sangue no tapete, ele estava de bruços, cheio de cortes, as mãos e a língua jogadas num canto, a mandíbula cortada fora e o pênis enfiado no ânus.
— É. Ele realmente se fodeu — Jack ria enquanto falava.
— Estamos falamos de um assassinato, droga! Não é engraçado!
— Na verdade é. Mas enfim, continua.
— Eu precisava investigar o que tinha acontecido, então peguei uma toalha e comecei a procurar. O lugar estava um caos. O sujeito devia ter tentado resistir e acabou transformado o quarto numa zona de guerra. O computador dele tinha sido esmagado e não parecia acidente. Tirei o HD dele, achei que pudesse ter algo de útil lá dentro, dei mais uma olhada e fui embora. Chamei a polícia mais tarde e eles cuidaram do resto. De manhã a notícia estava em todo lugar. Já via aquilo virando a conversa da semana na televisão. De todo jeito, na primeira chance que tive, eu instalei o HD no computador e procurei alguma coisa que desse uma pista do que tinha acontecido naquele quarto. Tentei ver o e-mail, mas estava protegido com senha. Praticamente tudo estava, na verdade. Dei uma olhada no histórico do navegador e, bem, lá estava um leva de acessos ao board em que postaram a mensagem. Não faço ideia de por que ele abriu um tópico na internet ao invés de chamar a polícia e não acho que vá descobrir a razão.
— Só achou isso? — Jack perguntou.
— Não. Para minha sorte, o sujeito estava com a webcam ligada. Ele gravou tudo.
— E por isso quebraram o computador. Esperto. E o que tinha no vídeo?
— Esse é o ponto em que tudo fica mais estranho. No vídeo aparecia uma garota junto com o homem. Ela devia ter uns vinte anos, não tinha como saber com certeza. Os dois estavam discutindo e pareciam muito nervosos. A certa altura o homem agarrou um abajur e arrebentou ele na cabeça da garota. Jack, ela nem se moveu. O sangue estava escorrendo da cabeça e metade do rosto dela estava destruído e ainda assim ela ficou parada como se não tivesse acontecido nada. E daí ela sacou uma faca. Eles brigaram, o homem acertou mais algumas pancadas na garota até que ela conseguiu cravar a faca na virilha dele só para logo depois arrancar a mandíbula inteira daquele homem fora com um golpe. Depois disso, ela notou que a câmera estava ligada e quebrou o computador.
Jack bebeu mais um pouco da cerveja e ficou olhando para a garçonete que servia a mesa ao lado. Quando cansou disso, ele virou-se outra vez em minha direção.
— Beleza — ele falou. — Uma morte bizarra, mas ainda não é um caso.
— E ainda assim, a Máquina do Mundo acusou uma anomalia.
— Vai ver ela errou.
— Ela nunca erra, Jack. Tinha uma anomalia e eu ia achar ela. Resolvi procurar alguma coisa sobre a garota. No dia seguinte, depois da faculdade, passei na delegacia para pedir a um amigo meu que trabalha lá para tentar ver algo sobre a garota. Falei que ela tinha se mudado para perto de casa e tinha alguns hábitos estranhos. Ele me devia um favor, então fez vista grossa para a desculpa idiota. Como a busca ia demorar, tive que esperar sentado. Ou ao menos esse era o meu plano. O caso é que dois dias depois, por volta das dez da noite, veio outro alerta. Fui correndo atrás do sinal achando que dessa vez pudesse encontrar alguma pista. O lugar ficava mais longe da minha casa do que da última vez. Dificilmente eu chegaria a tempo de evitar a morte, mas, talvez, ainda conseguisse encontrar a garota. Só que não teve jeito. Um acidente travou uma das pistas que eu tinha de pegar. Até eu escapar dele já eram onze horas. Resolvi continuar mesmo assim. Já estava lá, podia ser que ainda encontrasse algo que valesse a viagem. Deixei meu carro estacionado num lugar mais seguro e segui em frente. Dessa vez não era condomínio de luxo nenhum. Longe disso. Eu estava no meio de uma favela. Eu conseguia sentir as pessoas me olhando torto enquanto eu passava pelos becos. Provavelmente achavam que eu queria comprar drogas. Pensei que fosse melhor não chamar atenção, então tentei ser rápido. O alerta vinha de uma casa bem melhor que o resto. A porta dela estava entreaberta, então me esgueirei para dentro quando não tinha ninguém olhando. Outra vez, encontrei uma cena de um filme do Rob Zombie. O corpo estava espalhado no meio da sala. Era um negro de quase dois metros, o tronco aberto na vertical e os órgãos jogados pelo cômodo. Os olhos estavam cortados, as mãos e a língua tinham sido arrancadas, o pênis estava dentro da boca e a cabeça no buraco deixado pelos órgãos. 
— Isso que é solidão — Jack comentou bebendo mais cerveja.
— Jack! — exclamei.
— OK, OK. Continua.
Me recompus e refiz os acontecimentos outra vez. Me senti um pouco enjoado e, no primeiro instante, achei que fosse vomitar, mas a sensação passou logo.
— Dessa vez não tinha nada que parecesse poder dar qualquer pista do que tinha acontecido naquela sala — expliquei. — Voltei à rua e perguntei para primeira pessoa que vi se mais alguém tinha entrado naquela casa antes de mim e ela me disse que uma garota esquisita havia aparecido e mais ninguém.
— A mesma garota.
— Foi o que pensei também. Depois disso eu volte para casa. Pelo resto da semana não tive nenhum caso parecido com esse. Uma fada perdida me pediu ajuda para recuperar as asas dela de uma Bruxa, mas não passou disso. No meio da outra semana o meu colega policial me ligou. Ele perguntou se eu tinha certeza sobre a garota e eu falei que achava que sim. Ele estranhou e disse que o nome da garota era Lavínia Costa e Silva. Ela estava desaparecida havia cinco anos. Os pais abriram um boletim de ocorrência na época e a polícia chegou a fazer buscas, mas acabou não dando em nada e o caso foi arquivado. Ele pediu o endereço onde ela estava e eu inventei uma desculpa qualquer sobre ter me enganado. Ele deixou por isso mesmo. Perguntei dos pais dela, disse que era só curiosidade, e ele passou o lugar onde os dois moravam. Agradeci e terminamos por ali a conversa. O caso é que eu já sabia quem era a garota e entendia pelo menos parte do modus operandi dela.
Pausei um momento para formular o que eu precisava falar.
— Me diz, Jack, você já leu Titus Andronicus?
— Não. De quem é?
— Shakespeare. Na peça há uma personagem chamada Lavínia. Ela é a filha do protagonista, Titus Andronicus, e, no começo da peça, o noivo dela é assassinado, ela é estuprada e, para impedir que sejam delatados, os bandidos cortam as mãos e a língua dela. No fim, Titus mata os estupradores, Lavínia e se mata.
— Mãos e língua, é?
— Exatamente como os corpos. Resolvi visitar os pais dela no dia seguinte. Não foi difícil de achar. Era uma família conhecida, dona de uma transportadora. Cheguei à casa deles e pedi para falar com a mãe dela. A mulher estranhou quando eu apareci e quase me enxotou quando toquei no nome da filha dela. Ela só se acalmou quando eu mostrei uma imagem dela. Entrei e começamos a conversar. A mulher disse que a filha havia desaparecido quando tinha treze anos depois de sair de casa por causa de uma briga com o pai. Como ela demorou para voltar, resolveram avisar a polícia. Não teve resultado algum, como eu já sabia. Eu perguntei se havia qualquer coisa incomum sobre a Lavínia, mas aparentemente ela era uma garota normal. Tentei sondar a mulher em busca de mais informações, porém foi perda de tempo. Ela realmente não sabia de nada. Quando eu estava indo embora, ela perguntou se eu sabia onde a filha dela estava. Respondi que não, mas que estava tentando encontra-la. Ela quis saber quem eu era. Inventei uma história sobre estar ajudando meu pai que era chefe de uma ONG que buscava pessoas perdidas, agradeci a ajuda dela e fui embora. Resolvi passar num café e comer alguma coisa para tentar organizar tudo que passava na minha cabeça. Aquele caso não fazia sentido algum. Garota desaparece e cinco anos depois ressurge como uma serial killer. E foi sentado naquele café que me veio à mente a explicação óbvia.
— Vingança — Jack adiantou-se a falar.
— Exato. Resolvi tentar checar o histórico dos mortos e procurar outros casos parecidos com esses. No total, cinco pessoas haviam sido mortas nos últimos sete meses em situações parecidas com os dois. Desses cinco, três inclusive os que eu encontrei, tinham sido acusados de ligações com tráfico de pessoas e sequestro, mas todos haviam sido absolvidos por falta de provas. Ligar os pontos foi fácil.
— Ela estava se vingando dos sequestradores.
Acedi.
— Mas as mortes eram violentas demais e isso ainda não explicava porque uma anomalia tinha aparecido — explanei. — Faltava alguma coisa.
Fui beber mais um pouco de água, mas minha garrafa estava vazia. Pedi outra para o garçom que a trouxe. Uma vez que terminei de beber, continuei a história.
— O caso ainda não era meu, entende? — falei. — Se fosse apenas uma garota se vingando, tudo bem, eu poderia tentar ignorar. Mas havia uma anomalia envolvida nisso então não tinha como simplesmente deixar para lá.
— Sempre tão responsável — Jack riu. — E o que você fez?
— Não tinha muito que eu pudesse fazer. Tinha que esperar ela agir antes de continuar. Comecei a patrulhar o centro da cidade toda noite, torcendo para que da próxima vez que ela aparecesse eu pudesse chegar a tempo. E acho que a sorte estava do meu lado. Três dias depois que eu comecei as rondas, outro alerta apareceu. Estava relativamente próximo, numa área de prédios comerciais. Corri até lá o mais rápido que pude. Parecia que ela estava no oitavo andar. Tinha seguranças na porta e eles não iam me deixar passar. Tive que subir num prédio vizinho, escalar por fora e pular para aquele em que ela estava. Acabei atravessando uma janela e um segurança me viu. Não teve jeito, acabei desmaiando o homem com um soco para evitar que ele chamasse ajuda. Só me restava ir atrás da garota.
"O prédio estava quase todo vazio, encontrar alguém ali não deveria ser um problema. E realmente não foi. Quando entrei numa sala grande, me deparei com um homem de terno se arrastando no chão enquanto a garota ameaçava ele com uma faca. Assim que eu entrei, ela saltou para cima de mim. Acabei reagindo num impulso e soquei ela no peito. Senti a caixa torácica dela quebrando e o coração explodindo. O corpo voou até bater numa parede. Na hora, quase entrei em pânico. Não era para ela morrer. Corri para ver se havia algo que pudesse fazer, mas o homem gritou para que eu tomasse cuidado. Num primeiro momento não entendi o que ele quis dizer, mas no outro senti algo se aproximando e me virei a tempo de parar com o braço uma faca que vinha contra o meu pescoço. A garota estava de pé e me atacando! E a pior parte é que ela era assustadoramente boa. Os golpes eram difíceis de acompanhar, a precisão era assustadora. Ela me acertou duas vezes e se eu não estivesse usando magia para aumentar minha resistência ela teria me matado ali mesmo. Consegui desarma-la e fazê-la recuar quando ela ficou sem fôlego depois de uma série de golpes rápidos. Ia tentar agarra-la, mas antes que tivesse uma chance ela correu em direção a janela e pulou para fora. Corri até lá e vi o corpo batendo no chão só para uns instantes depois se levantar e sair correndo normalmente".
— Realmente é uma anomalia — Jack comentou, meio pensativo. — Mas, e aí?
— Fiz o óbvio: interroguei o homem que ela tinha tentado matar. No começo ele resistiu a falar, mas depois de levá-lo até o terraço e deixa-lo pendurado por uma perna, o sujeito amoleceu. E eu acho que nunca desejei tanto não ter ouvido algo quanto desejei não ter ouvido o que aquele filho da puta disse.
— Uau. Para você usar palavras desse nível o negócio deve ter sido feio mesmo.
— Você não faz ideia, Jack. Foi horrível. Aquele sujeito era advogado, parte da mesma quadrilha dos homens que a garota tinha assassinado. Eles sequestravam garotas menores de idade e as forçavam a se prostituírem. Alguns dos desgraçados que iam atrás das garotas pagavam caro para estuprar, torturar e matar garotas virgens. Algumas não tinham nem doze anos quando eram pegas. Quando acharam a Lavínia perdida na rua, pegaram ela por que um político tinha pago muito dinheiro para que conseguissem uma garota com os traços dela. Na mesma semana, o político apareceu e, quando ouviu o nome dela, decidiu reencenar Titus Andronicus estuprando, mutilando e esfaqueando ela até a morte. Depois disso, ele foi embora sorrindo e agradeceu pelo negócio.
"No dia seguinte, quando foram limpar o quarto onde tinha acontecido aquilo, acharam a garota viva. Os sujeitos surtaram, pensaram que tinham enlouquecido ou que alguma coisa tinha dado errado. Só que tinham gravado tudo nas câmeras de segurança. Eles assistiram e assistiram e assistiram até que entenderam que a garota tinha morrido e voltado à vida. E então tudo ficou ainda pior. Eles tinham uma garota que ressuscitava virgem quando era morta e decidiram lucrar com isso. Começaram a alugar a garota para sessões de tortura cada vez mais agressivas, filmavam tudo e vendiam na internet. Isso durou dois anos. Dois anos sendo morta e torturada constantemente até o dia em que eles se descuidaram e ela conseguiu fugir. A quadrilha tentou recaptura-la, mas eventualmente desistiram. Provavelmente pensaram que não fossem vê-la nunca mais. Dois anos depois, pessoas começam a morrer e em um ano quase todos os envolvidos no caso dela estavam mortos".
Parei de falar e bebi mais água. Minha garganta começava a doer, minha cabeça rodopiava com as memórias de tudo aquilo. Jack dessa vez não falou nada, apenas bebeu a cerveja e ficou olhando para dentro dele mesmo. Eu quase conseguia ouvir os pensamentos dele: "Bem feito", "Mereceram", "Ela está certa". Revirei um pouco minha comida e fui beliscando enquanto esperava ele se recuperar para poder continuar. Levou alguns minutos até ele levantar o olhar para mim e perguntar:
— O que você fez com o cara?
— Levei ele para o meu pai. Eu não tinha ideia do que fazer, precisava de uma opinião. Meu pai deixou o sujeito dormir na sala e depois me levou para o quarto dos fundos. Contei a história para ele e, assim que terminei, ele disse que conhecia histórias de pessoas com casos parecidos, embora não completamente iguais. Ele me perguntou o que eu ia fazer quanto ao homem que eu salvara e eu disse que não sabia. Ele tinha cometido crimes, mas não tinha como provar. A única pessoa que eu sabia que tinha sido morta por eles estava viva e com o cartel desmantelado seria difícil conseguir ligar ele a qualquer outra vítima. A lei não podia fazer nada contra ele.
— Então deixasse a garota cuidar dele — Jack falou.
— Se eu deixasse ela iria cruzar a linha. Se ela terminasse a vingança dela eu ia ter que dar um jeito de parar ela.
— A garota era inocente! Os caras que fizeram aquilo com ela é que eram os monstros! Eles cruzaram a linha!
— E deixar ela virar um monstro como eles ia ajudar em alguma coisa? Isso ia apagar a dor que ela sentiu ou os anos de sofrimento?
Jack cruzou os braços e permaneceu me encarando em silêncio.
— De todo modo — prossegui. — eu não podia esperar. Fiz com que o sujeito me contasse onde estavam o resto da quadrilha e ele falou que só tinha mais um vivo, o político que comandava o grupo. Peguei o endereço do sujeito e fui atrás dele. Enquanto eu dirigia, a Máquina do Mundo alertou para outra Anomalia. A garota estava se movendo. Acelerei o carro, ignorei todas as leis de trânsito possíveis e cheguei ao endereço com esperança de que não fosse tarde demais. Era uma mansão num bairro de luxo, o tipo de lugar caro que custa demais para um vereador poder comprar. Os seguranças estavam desacordados quando eu cheguei lá. Pulei o portão e comecei a busca por ela.
"Me lembro do resto como se tivesse acontecido hoje. A garota no corredor, o político se arrastando no chão e apontando uma arma para ela... Quando eu entrei, os dois olharam para mim. Eu gritei para ela parar, que eu podia ajudar ela, que não precisava mais ser daquele jeito. Ela não me ouviu. Disse que eu nunca ia entender o inferno pelo qual ela tinha passado e tudo era culpa daquele homem. Eu não sabia mais o que fazer. Ela não ia me ouvir e eu não podia culpa-la. Eu sabia que ela estava certa, que eu nunca ia entender o que ela tinha sofrido. O político começou a gritar, implorar para que eu o salvasse, me ofereceu qualquer coisa que eu quisesse para matar a garota. Ela perdeu a cabeça e se jogou para cima dele".
Parei de falar. As sensações voltavam, os sentimentos que senti naquele instante, o medo, a indecisão, a raiva, a impotência, todas as coisas que eu achei que nunca mais fosse sentir. Eu via ela, passo a passo, chegando mais perto, descendo a mão com a faca na direção da cabeça do político.
— Sabe, acho que foi nesse momento que eu entendi o que nós somos — falei. — Eu não sei. Ali, com aquela escolha nas mãos, eu senti que... que não tinha opção de verdade. Antes que a garota conseguisse acertar o político, eu quebrei o pescoço dele. Senti ele resistindo, senti ele morrendo. Eu nunca tinha matado ninguém desse jeito antes. O mais estranho é que eu não senti remorso.
— Não tinha motivo para sentir. Você fez o certo.
— O certo... — murmurei. — Quando eu fiz isso, a garota ficou me encarando como se não entendesse o que tinha acontecido. Eu estendi a mão para ela, mas ela não se moveu. Ficou só ali, me encarando desconfiada até dar as costas e ir embora. Não fui atrás dela. Voltei para casa. No dia seguinte meu pai me disse ter deixado o outro homem ir embora, porém, indo atrás dele, eu descobri que ninguém sabia dele tanto no trabalho quanto em casa. Preferi não ir atrás disso. Por fim, antes que pudesse voltar à minha vida, decidi visitar a família da garota. Acho que, no fundo, esperava me encontrar com ela.
— E ela estava lá?
Não precisei responder. A porta do restaurante abriu e por ela entrou alguém. A pessoa caminhou até nossa mesa. Ela e Jack se entreolharam por um momento. Ela então se sentou ao meu lado, empurrando-me para abrir espaço.
— Então, é esse aí? — ela disse apontando para Jack.
— É, esse é o Jack — falei. — Jack, essa é a Lavínia.
Jack sorriu, terminou o hambúrguer e a cerveja e se levantou da mesa.
— Prontos? Temos um vampiro a caçar.
Concordei. Terminei de comer e paguei a conta. Quando saímos do restaurante, já era noite e uma lua cheia, grande e pálida flutuava entre nuvens e noite como uma gigantesca água-viva. Sorri.
— Está sorrindo por quê? — Lavínia me perguntou.
— Por nada. Vamos. Temos trabalho a fazer.
[close]

Eu realmente estou ficando muito babaca... ou muito velho. Você decide.

E ai Moon[light], blz?!

bom, vamos a alguns pontos:

1- tem algumas palavras repetidas ali no começo: "eu cheguei ao cheguei ao minúsculo..." e tem uma parte onde falta um pedaço: "a noite começou a pintar o céu da e só então";

2- onde vc fala q chegou "bem antes da pessoa que me convidara" eu fiquei com a impressão q a personagem havia chegado antes do horário marcado, mas na sequencia é narrado q a outra pessoa "jamais chegaria na hora", e então fiquei na dúvida se alguém se adiantou ou se alguém esta atrasado...

3- "Jack ficou encarando os arredores do restaurante", vc esta querendo dizer q ele ficou do lado de fora observando as ruas, avenidas e vielas ao redor do restaurante? ou vc estava querendo dizer q Jack observou os quatro cantos do restaurante?

4- "Você toma conta disso daqui a dois anos já", não fica melhor "disso aqui" ou "daqui" ou "desse emaranhado de prédios"? rs...

5- "Ele terminou a cerveja e pediu outra ao garçom, que não pareceu muito feliz, mas trouxe a bebida mesmo assim." Apesar de achar q o dialogo q veio a seguir foi bom, mostrou q as personagens se conhecem um pouco mais e possuem uma certa liberdade entre elas, ficar bebado com 2 latinhas e o garçom chateado é um pouco de mais, não? rs...

6- "achei eu pudesse ter algo de útil lá dentro", só ajustar ali.

7- "Uma morte bizarra, mas ainda não é um caso." não é bem assim, meu caro Jack, veja q um pouco antes "A certa altura o homem agarrou um abajur e arrebentou ele na cabeça da garota. Jack, ela nem se moveu. O sangue estava escorrendo da cabeça e metade do rosto dela estava destruído e ainda assim ela ficou parada como se não tivesse acontecido nada." e logo depois "...arrancar a mandíbula inteira daquele homem fora com um golpe." Até o Sam e o Dean iriam checar esse caso! rs...

8- "encontrasse algo eu valesse a viagem." e "num lugar mais seguro e seguir em frente"

9- "— Jack! — exclamei." pqp, pareceu uma menininha falando! o cara caça bizarrices, ele tem q ser mais durão! rs...

10- "Lavínia Costa e Silva" neta do Marechal? outra coisa, com esses sobrenomes, alguém chamado Jack não fica meio deslocado na história?

11-  "não entendi o que ela quis dizer," aqui é "ele".

12- "da mesma quadrilha que os homens que a garota tinha assassinado.", não fica melhor "dos homens"?

13- "pegaram ela por que" não fica melhor "pegaram-na" ou "eles a pegaram"? "podia ajudar ela" podia "ajuda-la" fica melhor, não?

14- "... eu não precisava mais ser daquele jeito." ou aqui vc substitui por "que" ou muda a frase.

15- "Eu via ela passo a passo chegando mais perto...", apenas alguns ajustes "Eu a via, passo a passo, chegando mais perto..."

16- "ficou me encarando como seu não entendesse"

Gostei! Gostei desse texto... o mistério imposto (quem era a garota, pq ela matava, qual era a anomalia, quem era a dona da cidade e qual era o caso q Jack queria ajuda) levam o texto a frente e deixam muito espaço para o leitor se perguntar "o q esta acontecendo?". Claro q por deixar tantas lacunas o texto pede uma continuação.

Os pontos q coloquei acima, coloquei enquanto lia, então esses são pensamentos q me ocorreram durante a leitura e não de forma posterior, sendo assim pode ser q haja mais coisa para ser revisado.

Aguardando a continuação, então boa sorte e bom trabalho! rs...

Opa, valeu pelo comentário. Tem umas coisas aí que realmente foram mancadas da minha parte. Vou arruma-las logo logo.
Agora, sobre os pontos que dá para responder:
2 - Os dois. Um chegou adiantado e outro chegou antes da hora. Se dá para dizer que o Jack sempre se atrasa, daria para dizer também que o Daniel sempre chega antes da hora.
10 - Jack é americano. Sei que isso não é explicado (aqui), mas ele é um personagem já estabelecido em histórias anteriores do cenário. Ele só está no Brasil atrás do vampiro. E o sobrenome da Lavínia é uma referência ao general, sim. Sem motivo particular, porém. Foi, tipo, o primeiro sobrenome em que pensei e aí ficou.
13 - Isso é mais da maneira como eu tento fazer o diálogos. Dentro do (possível) tento deixar eles menos "gramaticais", aproximar o máximo que der de como as pessoas falam e, bem, como esse texto é um diálogo enorme, isso ficou mais na vista.
Bom, valeu por comentar e pela ajuda com as besteiras que eu cometi o/

Eu realmente estou ficando muito babaca... ou muito velho. Você decide.