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A canção dos deuses

Iniciado por Moon[light], 08/03/2014 às 07:16

Em certos momentos da história, eu tenho certeza, quando viram acontecer diante de si algo nunca antes visto, pessoas souberam que a partir daquele momento nada seria como era antes. Quando o primeiro homem descobriu o fogo, quando do mastro de um navio um marinheiro enxergou a América, quando os franceses tomaram a Bastilha... Oppenheimer, vendo a detonação da primeira arma nuclear disse que "nós sabíamos que o mundo jamais seria o mesmo". Até aquele dia, eu não entendera o peso daquela frase.
Dez anos atrás, foi quando aconteceu. Eu era então só um garoto nos seus anos de colegial, cheio de sonhos e esperanças para o futuro. Vivia com meus pais, meus irmãos num apartamento pequeno no subúrbio de uma grande, imponente metrópole. Por toda a minha vida, eu assistira da janela do meu quarto aquela cidade crescer. Prédios tornavam-se mais altos, mais numerosos, helicópteros cortavam o céu com cada vez mais frequência, as noites se tornavam cada vez mais claras. Havia em mim uma sensação de tranquilidade, de certeza. Eu passara a acreditar que nada podia parar o avanço da cidade, que tudo seguiria naquele ritmo para sempre, espiralando em direção aos céus.
Eu estava errado.
Eu me lembro como se tivesse acontecido poucos minutos atrás. Acho que todos se lembram. Naquela manhã, eu acordei inquieto. Tivera pesadelos. Me levantei da cama e sem me preocupar muito com nada, apenas caminhei até a cozinha de casa. Queria só um copo de água. Enquanto enchia um copo com água da torneira, senti um leve tremor. A princípio, achei que estivesse passando mal. Não estava. Tentei pensar então que fosse algo da minha cabeça, que tivesse apenas imaginado aquilo. Os tremores continuaram. Percebi então que eles seguiam um ritmo controlado, cadenciado. Como passos. Eu fui até a sala, liguei a televisão sem prestar muita atenção às notícias, e de lá para a varanda. Uma neblina densa envolvia a cidade como um véu mortuário. Apenas as luzes dos prédios se destacavam entre o branco úmido. Os tremores continuavam no mesmo ritmo, porém cada vez mais fortes, talvez, apenas talvez, mais próximos.
E então eu ouvi.
Era um som como nenhum outro que já tivesse ouvido, como uma canção profunda, ancestral, ecoando etérea, fantasmagórica, pela névoa. Era como se os próprios deuses cantassem naquela manhã.
Vi então da névoa surgir uma criatura como nenhuma outra. Era maior do que eu sonhara algo poder ser, mais magnífico, mais nobre. Grandioso. Um grande dragão, branco e dourado, sem asas, andando sublime entre os prédios, sua cabeça erguida muito, muito acima deles. A cada passo que a criatura dava, o mundo estremecia, a cada metro que ela avançava, um prédio caía, como um grande rei caminhando entre as ruínas de seus súditos. Era a mais bela das criaturas, era a mais terrível das criaturas.
Pela televisão, ouvi gritos de jornalistas, desesperados, falando de destruição e terror em dezenas de cidades pelo mundo, de morte, de dor, de monstros.
Eu não conseguia me importar. Eu não conseguia temer. Naquele momento, tudo que sentia era absoluta dissolução de mim na criatura que eu via e a certeza, a completa e total certeza, de que o mundo jamais seria o mesmo.

Eu realmente estou ficando muito babaca... ou muito velho. Você decide.

Eu adorei o texto até certa parte.
A descrição do do garoto se sentindo estranho até a névoa realmente me deixou apreensivo! Mas aí, quando você apresentou o dragão, cortou um pouco o clima.
Não que um dragão não seja uma coisa assustadora, mas os dragões como conhecemos e como nos foram apresentados perderam o efeito do medo. Não sei se era esse seu objetivo, o suspense com algo mais assustador, mas se era, você poderia ter tido uma pegada de Lovecraft e ter descrito uma criatura diferente, algo que não desperte memórias seguras na mente das pessoas. Algo "terrível como um dragão", não um dragão propriamente dito, e adicionar alguns outros elementos próprios.


Hasta lá vista